sábado, setembro 02, 2006

FOTOGRAMAS: Os Tempos que Mudam, 2004

Uma mão apresenta uma fotografia a outra mão. Na imagem está inevitavelmente um passado, um passado que teima em não abandonar o presente — em boa verdade, como se o passado fosse apenas uma forma peculiar do presente. Na fotografia está Cécile, aliás Catherine Deneuve; o homem que a procura é Antoine, aliás Gérard Depardieu. A remota história de amor que viveram é feita dessas imagens que já se libertaram do condicionalismo do tempo, por assim dizer impondo-lhe a sua própria medida. Aliás, a frase promocional do filme resume de forma admirável a ambivalência afectiva que é o mais belo tesouro do cinema de Téchiné: "Um primeiro amor pode tornar-se um último amor?".
Fiel ao património em que o seu trabalho se enraíza, Téchiné sabe, afinal, que convoca um par com um significativo peso mitológico na história do moderno cinema francês. Foi, de facto, em 1980, no belíssimo O Último Metro, que François Truffaut juntou pela primeira vez a frieza paradoxal de Deneuve e a agitação sempre vulnerável de Depardieu — evocar (ou invocar) Truffaut é mais do que uma mera citação cinéfila: é também uma maneira de celebrar a perenidade estética e moral do género melodramático.
Desgraça muito nossa: outro sublime encontro melodramático de Deneuve e Depardieu — Drôle D'Endroit pour une Rencontre (1988), de François Dupeyron — nunca teve lançamento comercial nas salas portuguesas.

LES TEMPS QUI CHANGENT / Os Tempos que Mudam
França, 2004
Realização: André Téchiné
Produção: Paulo Branco
Argumento: A. T., Laurent Guyot e Pascal Bonitzer
Interpretação: Catherine Deneuve, Gérard Depardieu, Gilbert Melki, Malik Zidi

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