
Ficção? Não, Voo 93 não é uma ficção. É uma tentativa de reconstituição (um docudrama, talvez), tão fiel quanto possível, dos factos que se viveram nessa manhã de há cinco anos entre a cabina de um avião desviado e os centros de controlo aeronáutico (civil e militar) de uma América afinal não preparada para o pior. A equipa de produção socorreu-se das últimas chamadas telefónicas dos passageiros, dos registos de voo, dos factos, e a eles se fixou. Ponto final. Personagens? Não, Voo 93 não é um filme de personagens, antes, um aglomerado de meros figurantes. Limita-se a colocar-nos perante anónimos que se cruzaram numa manhã de Setembro e deles mais não mostra (nem deve mostrar) que o presente, o instante. O anonimato que só os noticiários transformaram em algo que nenhum deles esperava.
A verosimilhança que se procurou em Voo 93 não deseja maior profundidade dramática, não ensaia a ficção onde a demanda pede um realismo quase de registo noticioso… Paul Greengrass resistiu depois à tentação de cantar como heróis as vítimas do despenhamento do único voo que falhou o alvo (segundo o filme, o Capitólio). Mostra-as antes como as primeiras figuras de acção do pós-11 de Setembro, confrontadas com uma morte inevitável, decididas apenas a evitar que mais vidas fossem ceifadas. O sentido realista do filme não cede também perante os excessos barrocos do filme-catástrofe (nos quais o herói, nem que um apenas, sobrevive depois de física e mentalmente posto à prova). Em suma, Voo 93 abre sóbria e inteligentemente um arquivo que a memória não vai esquecer. Depois da realidade, venha a ficção.