segunda-feira, maio 22, 2006

Discos da semana, 22 de Maio

Pet Shop Boys “Fundamental”
Apesar de estarm tranquilamente habituados a ver o soberbo best of de 2003 Pop Art ser habitualmente apontado como o seu disco de referência (o que não mais traduz que uma sólida herança de uma identidade pop nascida e criada em singles), os Pet Shop Boys também contam na sua já longa discografia de mais de 20 anos com uma pequena mão-cheia de álbuns absolutamente clássicos. São eles Behaviour (1990), Very (1993) e Nightlife (1999). Um trio ao qual se junta onovo e magnífico Fundamental, o seu melhor disco em mais de dez anos.
Gravado em parceria com Trevor Horn, repleto de exemplos de uma escrita clássica, inteligente e segura, capaz de suportar uma agenda de ideias onde a crítica se desenha essencialmente pela ironia, o álbum é monumento coeso dividido entre épicos de grandiosidade sinfonista (na melhor tradição com raiz num It’s A Sin ou Left To My Own Devices), ora procura a placidez de ambientes capazes de suportar histórias para ler (ou, antes, cantar) devagar.
Apesar deste sólido sentido de unidade que o todo sugere este é o álbum no qual o duo apresenta a sua maior e melhor colecção de singles potenciais desde o vitaminado Very. Se I’m With Stupid (evidente caricatura da relação entre Blair e Bush, projectada na pele aparente de um qualquer casal) a eficácia do refrão se escuta como o grupo não nos dava há muito, em Sodom And Gomorrah Show, Minimal ou Integral revelam-se canções na melhor tradição “simplesmente pop”, às quais Trevor Horn concedeu moldura imponente, quase a lembrar a grandiosidade garrida que há 22 anos concedeu à histórica estreia dos Frankie Goes To Hollywood. Depois há uma outra face, tranquila, mas plena de sentidos e humor, que fazem deste disco uma peça pop irresistible.

Hot Chip “The Warning”
The Warning é um depoimento seguro das suas estruturas electrónicas, mas igualmente firme na vontade de captar traços de fragilidade humana, aí sendo protagonistas as vozes de Alexis Taylor e Joe Goddard, que já lhes mereceram comparações (em jeito de carteira de afinidades) a nomes como os de Jeff Buckley, Beth Orton e… Nick Drake. Este último parece, de resto, correr nas entrelinhas de alguns temas onde aflora uma certa ingenuidade melodista pastoral, criando possíveis proximidades com o que recentemente escutámos no belíssimo Love Songs Of The Hanging Gardens, de Kelley Polar. As premissas estruturais antes encontradas preferencialmente na “bíblia” electro de Prince, Dirty Mind, dão lugar a diálogos com versáteis heranças que não escondem passagens por discos dos Devo, Beach Boys, Giorgio Moroder, Portsihead, Neil Young ou Madlib.O álbum reforça um sentido estético que opta pelo deleite perante o detalhe, mesmo que imperfeito e não virtuoso, heranças lo-fi que aqui são já princípio assente. O som, apesar de dominado pelas electrónicas, traduz uma vivência “caseira” em regime “faça você mesmo”, que permite às composições um processo de criação e evolução quase carnal, humana. Ou seja, apesar da evidente presença de computadores, uma pulsão humana nada “kraftwerkiana” acaba por dominar a arte final. Assim, sobre a solidez estrutural do geometrismo digital que coordena a construção das canções, há por aqui mais proximidade para com um apelo de vida não maquinal apendido a ouvir pop e folk, assim como uma subtil delicadeza para zeros e uns como a que recordamos no magnífico, mas ignorado, Folly do projecto Fort Dax.

Houdini Blues “F de Falso”
Ao terceiro álbum os Houdini Blues começam a deixar claro um caminho na primeira pessoa. Versátil na escrita, inteligente na interpretação, ousado nos arranjos, certeiro nas colaborações (sobretudo na oportuna presença de Adolfo Luxúria Canibal em Bailare), o disco é tudo menos falso. É um herdeiro de um sentido de demanda de personalidade e voz própria dentro do contexto da canção que convoca saudáveis memórias dos dias dos Rock Rendez Vouz, Mão Morta e Pop Dell’Arte como exemplos, nunca enquanto caminhos definidos e únicos a tomar. Pelo contrário, sentem-se já as marcas de autor e encenador neste disco, prova de que uma ideia por vezes exige tempo, e ensaios anteriores, para se começar a materializar. Sem dúvida, uma das poucas boas notícias da música portuguesa neste semestre de magra colheita.

Hugo Largo “Drum”
Editado em 1987, Drum revelou um grupo de personalidade única e uma música suave, elegante, austera na instrumentação e capaz de contemplar o sublime. Dissipada a euforia no wave que se seguira às influentes marés punk e new wave que haviam dominado as atenções da produção musical da cidade entre finais de 70 e inícios de 80, a baixa de Nova Iorque de meados de 90 era sobretudo um terreno de ensaio de uma nova música na qual o volume sonoro suplantava outras intensidades possíveis. É em nítida oposição a esta tendência que surgem os Hugo Largo. O grupo optou por uma formação que, desde logo, lhe permitiria afirmar uma identidade diferente, nomeadamente ao abdicar da tradicional presença de uma guitarra em favor de dois baixos, um violino e uma voz. A música dos Hugo Largo depressa atraiu atenções e gerou culto assim que foi editado o seu EP de estreia, produzido em 1987 por Michael Stipe, quatro temas sob o título Drum que, pouco depois, acabariam todas elas integradas no alinhamento de um curto álbum, com o mesmo título. A sensibilidade art rock que brotava das canções, a sua elegante instrumentação austera mas nem por isso despida de espiritualidade, pontuais laivos de minimalismo, texturas sugerindo espaço e, sobretudo, a voz teatral, cativante, de grande personalidade e sentido de liberdade de Mimi Goese, traduziam todavia um sentido de irreverência muito característico do meio em que esta música nascia, uma vivência entre espaços de afinidade com a cultura rock e as galerias de arte onde se revelavam visões de vanguarda. Uma obra-prima indie de finais de 80!

Também esta semana: Boy Kill Boy, Futureheads, Sex Pistols (reedição), William Orbit

Brevemente:
29 Maio: You Should Go Ahead, Expensive Soul, Clear Static, Radio 4, Frank Black, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Matthew Herbert, Can (reedições), Stuart Staples
5 Junho: Sonic Youth, Primal Scream, Scritti Politti, Feist (remisturas), Troy Von Balthasar, Dominique A, The Wrens

Discos novos ainda este ano: Woman In Panic, U-Clic, Muse, Lisa Germano (Julho), Whitest Boy Alive (Junho), Protocol (Verão), Thom Yorke (Julho), B-52’s, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Junho), Damon Albarn (Verão), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters (Outono), Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Jesus & Mary Chain, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição), Björk (caixa integral)

Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.
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