Estreia hoje em sala o filme Odete, segunda longa metragem de João Pedro Rodrigues. Depois da promissora curta Parabéns (1997) e do magnífico O Fantasma (2000), João Pedro Rodrigues mostra novamente, e como aqui se já afirmou, sinais claros de marcas autorais, como um gosto pelas figuras solitárias, que se marginalizam e vivem vidas em paralelo à dos comuns, seja numa lixeira (Fantasma) ou, sobre uma campa de um cemitério (Odete). Figuras que se transformam por acessos de perturbação emocional (a fuga perante o amor impossível, porque rejeitado, n’O Fantasma), ou, agora em Odete, uma gravidez bizarra. Depois há um evidente primor exigente pelo detalhe. Um rigor no enquadramento. Um olhar pensado pelas formas e cores. Ritmo e consequência na montagem. Um jogo de sons e silêncios com peso na caracterização das personagens (com inteligente inserção de música). E uma exigência notória de qualidade técnica na fotografia e som.
Odete é uma história que parte do real (como é firme na obra do realizador), mas que ruma ao limite do verosímil, numa Lisboa actual que se descobre em supermercados, discotecas, ruas nocturnas, solidões, encontros furtivos, cemitérios, onde os cruzamentos se fazem de carro ou telemóvel… ou patins. Odete e Rui têm vidas separadas. E entre eles passa Pedro. Ele morre num acidente na noite em que celebra o primeiro ano com Rui. Ela despeja do apartamento na cave o namorado, que lhe recusa fazer um filho. Rui e Odete, desamparados e abandonados, cada qual à sua maneira, vão cruzar-se numa história onde a loucura ou a assombração explicam o incrível feito real, e o sonho se transforma num espaço quase assustador…
Este é, sobretudo, um filme sobre a perda. O medo da perda e a forma como reagimos perante a morte. Em entrevista hoje ao DN, João Pedro Rodrigues diz que “Tudo isto nasce do medo que tenho de perder alguém que me é próximo. No filme tento ver o que faço. Se calhar isto vem dos filmes do John Ford. Uma das cenas de que mais gosto no A Paixão dos Bravos é aquela em que o Henry Fonda fala com o irmão que acabou de morrer. Fala com a campa... Isto é recorrente em filmes dele. Eu quis também que o filme fosse muito romântico. E é o cúmulo do romantismo ir-se viver para a campa de quem se ama. Apesar de ali haver também uma possessão.”
A entrevista pode ser lida aqui
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