segunda-feira, dezembro 05, 2005

Discos da semana, 5 Dezembro

Bernardo Sassetti “Alice”
Poucas semanas depois de editar um dos melhores discos da sua obra, Ascent, Bernardo Sassetti volta a marcar o ano musical com a edição em disco de uma das melhores bandas sonoras alguma vez compostas para um filme português. Em espaço não-jazz, a música de Alice é um espantoso universo de caminhos definidos ao piano (nos dedos do próprio Bernardo Sassetti), com intervenções do clarinete de Rui Rosa e do contrabaixo de Yuri Daniel, envolvendo ainda, a dados momentos, elementos ambientais da sonoplastia do filme, colocando esta música no seu lugar de origem: uma Lisboa de horas perdidas e sofridas, uma Lisboa actual e desencantada, melancólica. Os ciclos melódicos aceitam a ideia de temas e variações, num jogo em ciclos que nos encanta. Por vezes lembra os diálogos entre o piano e o clarinete do Facades, de Glassworks (Philip Glass, 1982), mas a personalidade de Sassetti e as intenções de contextualização desta música num espaço e numa história definem vida própria. Aplauda-se não só a excelente banda sonora, mas também a ousadia da aposta da Trem Azul numa edição de música para cinema feita entre nós. Coisa rara. Muito rara!

Da Weasel “Ao Vivo Nos Coliseus”
Depois de um DVD ao vivo e de um repackage do álbum anterior com extras, esta edição quase mais parece mais oportunista que oportuna. Pode ser até nociva para o futuro de uma banda que atingiu outros públicos e o chamado grande mercado com o álbum de 2004 corre o risco de agora afogar os admiradores em mais do mesmo, com eventual cenário de ressaca em episódio seguinte, como no passado já vimos acontecer a outros grupos portugueses. A alma verdadeira dos Da Weasel e a sua motivação podem contudo contrariar essa eventual tendência e garantir futuro mais sorridente… Quanto a este disco, mais não é que o documento de uma banda já segura de si, em palco, numa digressão em que tudo lhes correu bem. Um bom retrato, sem dúvida. Mas não era má ideia deixar a banda em pousio algum tempo depois de dois anos de tanta exposição como estes o foram.

Vários “Brokeback Mountain”
A banda sonora do mais recente filme de Ang Lee chega aos escaparates das discotecas antes do filme às salas. Nada de grave, podendo a música ser aqui um aperitivo capaz de garantir primeiras adesões ao filme que está a dividir opiniões na crítica americana (estreou esta semana nos EUA) mas que conquistou não só o júri de Veneza, como a opinião dos críticos portugueses que então o viram. A banda sonora junta à belíssima música original de Gustavo Santaolalla uma série de canções por nomes com filiação (mais ou menos evidente) no legado da música rural norte-americana, de Emmylou Harris a Rufus Wainwright, de Steve Earle a Willie Nelson, de Linda Rondstat a Teddy Thompson. Magnífica!

Bright Eyes “Motion Sickness”
Depois de ter editado dois álbuns notáveis na Primavera (o mais tradicional I’m Wide Awake It’s Morning e o mais digital, libertário e espantoso, Digital Ash In A Digital Urn), o prolífico e inspirado Connor Oberst fecha o ano com mais um disco, desta feita o registo ao vivo da digressão que lhe ocupou o ano. Ignora o disco pop (que todavia lhe deu um primeiro lugar no top com o fabuloso Gold Mine Gutted) e insiste num registo mais clássico, todavia com banda completa. Insiste bastante em I’m Wide Awake, junta temas antigos e versões de Feist e Eliott Smith e deixa-nos com uma terrível vontade de o ver por um palco por estes lados logo que possível.

Minotaur Shock “Maritime”
Este projecto não é mais que a aventura visionária de Dave Edwards, uma espécie de DJ Shadow inglês, com gostos versáteis e vontade em não deixar a obra apenas entregue às máquinas. O seu novo disco é um dos mais agradáveis que a 4AD editou nos últimos tempos, propondo uma série de paisagens nas quais as ferramentas electrónicas comandam os pincéis, mas não faltam outras “tintas”, do clarinete à flauta, dos violinos às vozes. Com inspiração ora apontada a um Wim Mertens, ora aos New Order, um mundo de sons que dá vontade de ouvir vezes sem conta.

The Hope Blister “Underarms and Sideways”
Ivo Watts Russell já não é o patrão da 4AD, e a memória dos “seus” This Mortal Coil guarda-se numa trilogia notável de álbuns que definiram um dos espaços mais marcantes da vida da editora, sobretudo em meados e finais de 80. The Hope Blister foi o projecto que criou nos anos 90 para dar nova voz a ideias musicais em nome próprio, mas em nada a coisa se compara ao outro grupo que inscreveu na história. Esta nova edição não é mais que a reunião do álbum de 1999 a um conjunto de revisões por um produtor amigo. Música ambiental, feita de texturas discretas e notas longas. Mas extremamente entediante e nada estimulante.

Também esta semana: John Lennon (DVD), Antony And The Johnsons (single), Kraftwerk (DVD), Jazzanova, The Killers (CD + DVD), Howard Shore (Lord Of The Rings 3CD + DVD)
12 Dezembro: Jens Leckman, Madonna (Confessions On A Dance Floor – ed. Especial), Beck (Guerolito), Elvis Presley (Sessões em Memphis em 1953/54 num single + DVD + livro)
19 Dezembro: Ryan Adams

Para 2006:
Janeiro: Strokes, Pop Dell’Arte, X-Wife, Cindy Kat, Heaven 17, Arctic Monkeys, Richard Ashcroft. Fevereiro: Pharell, GNR (tributo com bandas hip hop e r&B), Sparks, Pink Floyd (DVD)
Sem data: Outkast, Radiohead, Yeah Yeah Yeahs, Blur, Every Move A Picture, White Rose Movement, Camané (DVD), Madredeus (DVD), Amália Rodrigues (3CD antologia), Maria Teresa de Noronha (caixa)


As datas estão sujeitas a alterações. Nem todos os discos referidos têm edição nacional garantida pelas respectivas distribuidoras locais.

MAIL