terça-feira, novembro 01, 2005

Devos por Desplechin

Quem é Emmanuelle Devos? Em boa verdade, já a vimos em vários filmes franceses estreados entre nós: Nos Meus Lábios (2001) e De Tanto Bater o Meu Coração Parou (2005), ambos de Jacques Audiard; Esther Kahn (2002), de Arnaud Desplechin; O Adversário (2002), de Nicol Garcia; É Mais Fácil um Camelo... (2003), de Valeria Bruni Tedeschi; e Pequenos Golpes (2003), de Pascal Bonitzer. Vimo-la mas, provavelmente, acompanhámo-la com aquele olhar "distraído" de quem detecta uma espantosa secundária, mas não fixa a sua imagem.
Pois bem, aí está Reis e Rainha, de novo sob a direcção de Desplechin, para nos permitir reconhecer Devos em toda a sua grandiosidade: uma espantosa actriz, de genuína vocação melodramática, capaz das mais pequenas nuances emocionais, sempre com aquela vibração de quem não precisa de se impor à câmara porque, afinal, a câmara a adora.
Em todo o caso, seria redutor considerar Reis e Rainha como uma simples (re)descoberta de uma intérprete de excepção. E não só porque a seu lado surgem, por exemplo, o paradoxal (exuberante/contido) Mathieu Amalric e a sereníssima Catherine Deneuve, fazendo da própria serenidade um sinal das convulsões mais secretas. Para além de toda essa gente que é mesmo de carne e osso (de vez em quando, importa não termos medo de ser primitivo e resistir à retórica dos corpos digitais...), Reis e Rainha é também a prova real da importância fulcral de Desplechin: um dos maiores cineastas da França contemporânea, retratista da "vida-de-todos-os-dias" e das coisas sublimes e contraditórias que acontecem sob a capa da normalidade, seja ela conjugal, familiar ou sexual. Vamos ver se se confirmam as promessas da programação de Dezembro — em todo o caso, cinematograficamente, o mês não poderia começar melhor.

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