Tem-se, por vezes, a sensação (mediática, antes do mais) de a música popular do século XXI viver assombrada por uma cruel dicotomia: a de ir asfixiando, bloqueada entre o peso da tradição (rock, Springsteen, por exemplo) e os fulgores da descoberta (Beyoncé, hélas!). O problema não está nos méritos que possamos reconhecer (e não serão poucos, creio) de um ou outro lado da barricada. Digamos, para simplificar, que é sempre gratificante encontrar quem nos vem dizer que... não há barricada.
Enfim, a metáfora ajuda-nos a situar os Big Thief, ma non troppo. Acontece que, logo ao primeiro impacto, o seu terceiro álbum, U.F.O.F. ["UFO friend", de acordo com a canção-título] nos faz sentir, sobretudo pressentir, as paisagens de outros países, registadas em mapas menos consultados. Depois de Masterpiece (2016) e Capacity (2017), U.F.O.F. é mesmo um modelo de convivência íntima com os ovnis de um espaço musical que, de alguma nostalgia folk à mais serena independência sonora, nos envolve na sua delicada intimidade. Na trajectória da líder/compositora/cantora Adrianne Lenker, este parece ser, em última instância, um elaborado momento de balanço e máxima depuração.
Não há telediscos (pelo menos, para já). Eis o tema Orange, por certo um dos de gestação mais antiga — este é um registo da NPR, no SXSW 2017.
Orange is the color of my love
Fragile orange wind in the garden
Fragile means that I can hear her flesh
Crying little rivers in her forearm
Fragile is that I mourn her death
As our limbs are twisting in her bedroom
Lies, lies, lies
Lies in her eyes
She tells me to close and count to ten
As she wanders freely through the forest
Can I close and open once again?
The question that I seek for reassurance
Lies, lies, lies
Lies in her eyes
Hound dogs crowing at the stars above
Pigeons fall like snowflakes at the border
She kneels down and holds the frozen dove
The moon drips like water from her shoulder
Flies, flies, flies
Flies from her eyes
Orange is the color of my love
Fragile orange wind in the garden
Fragile means that I can hear her flesh
Crying little rivers in her forearm
Fragile is that I mourn her death
As our limbs are twisting in her bedroom