quinta-feira, setembro 20, 2018

Marceline Loridan-Ivens (1928 - 2018)

Cineasta e escritora, Marceline Loridan-Ivens reflecte na sua obra as memórias pessoais do Holocausto — este obituário foi publicado no Diário de Notícias (19 Setembro), com o título 'Marceline Loridan-Ivens: morte de uma resistente'.

Marceline Loridan-Ivens faleceu no dia 18 de Setembro, em Paris, contava 90 anos. No domínio cinematográfico, o seu nome é, antes do mais, indissociável daquele que foi o seu segundo marido, o holandês Joris Ivens (1898-1989), figura tutelar da história do documentarismo. Com ele realizou títulos tão marcantes como Le 17 Parallèle (1968), sobre os habitantes da “zona desmilitarizada” durante a guerra do Vietname e os seus modos de sobrevivência face aos bombardeamentos do exército dos EUA, ou Comment Yukong Déplaça les Montagnes, uma série de 12 filmes sobre a Revolução Cultural na China de Mao Tsé-Tung, rodados entre 1972 e 1976.
Num plano mais pessoal, realizou La Petite Prairie aux Bouleaux (2003), com Anouk Aimée, sobre uma francesa nascida numa família judaica, sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz. A evocação do Holocausto envolve, afinal, uma dimensão eminentemente auto-biográfica, uma vez que Marceline Loridan-Ivens sobreviveu, ela própria, ao encarceramento nos campos de Auschwitz, Bergen-Belsen e Theresienstadt.
Nasceu em Épinal, a 19 de Março de 1928, de seu nome Marceline Rozenberg, no seio de uma família judaica proveniente da Polónia. Aderiu à Resistência, na sequência da entrada dos nazis em território francês. Juntamente com o pai, foi capturada pela Gestapo, em 1943, tendo sido enviada para Auschwitz a 13 de Abril de 1944, no mesmo comboio em que seguiu Simone Veil (1927-2017). Recuperou a liberdade a 10 de Maio de 1945, quando o exército soviético chegou a Theresienstadt. Numa entrevista recente, resumiu a sua experiência, dizendo que “não sabíamos se íamos sair pela chaminé ou pela porta”.
Marceline Loridan-Ivens surge, ela própria, no filme Chronique d’un Été (1961), realizado por Jean Rouch e Edgar Morin, num célebre monólogo, na Praça da Concórdia, em Paris, evocando as deportações durante a Segunda Guerra Mundial. Esse é um título marcante do período de afirmação estética e social da Nova Vaga francesa.
Tratou as memórias dos campos da morte em dois livros, ambos escritos em colaboração com a jornalista e ensaísta Judith Perrignon. O primeiro, Et tu n’est pas revenu, surgiu em 2015, tendo-lhe valido o Prémio Jean-Jacques Rousseau; o segundo, L’amour après, foi publicado no passado mês de Janeiro — esta entrevista, no programa “La Grande Librairie”, da France 5, aconteceu por essa altura (legendas disponíveis em várias línguas, incluindo português).


>>> Obituário no jornal Le Monde.