Kim Jong-Un entra pela esquerda, Donald Trump pela direita. Numa encenação perfeita, conservando a ligeireza da espontaneidade, cumprimentam-se, sorriem e... retiram-se. Durante 46 segundos quase só se ouvem os motores das máquinas fotográficas dos repórteres, lembrando-nos que este é o mundo das photo ops.
O nosso mais primitivo desencanto iconográfico faz-nos repetir que nos transformaram em espectadores da própria produção das imagens, levando-nos a ignorar a dinâmica interna da política — e, nessa medida, a especificidade do trabalho dos políticos. Se quisermos ser menos cépticos, prudentemente esperançosos, diremos que a política passou a ser também a arte de gerir as imagens que testemunham os seus rituais.
Entretanto, reina a obscenidade cognitiva: a repetição incessante das mesmas imagens (da política ao futebol) ameaça entorpecer-nos, esvaziando não exactamente a nossa atenção ao mundo à nossa volta, mas a própria consciência crítica com que, noutros tempos, observávamos a acção dos políticos e outras figuras do domínio público — grita-se mais, especula-se infinitamente sobre a apoteose de coisa nenhuma, pensa-se menos. Num certo sentido, tudo é tratado como fait divers, como se 46 segundos pudessem conter o segredo do destino do planeta. Provavelmente, contêm.
>>> A cimeira de Singapura no New York Times.