Neill Blomkamp está a apostar na produção independente de curtas-metragens — este texto foi publicado no Diário de Notícias (2 Julho), com o título 'O apocalipse segundo Neill Blomkamp'.
De que falamos quando falamos de cinema independente? A pergunta não envolve qualquer suspeita em relação à produção dominante, nomeadamente dos grandes estúdios americanos — não só a história nos ensina a contrariar tal preconceito como as filmografias de autores como Clint Eastwood, Martin Scorsese, Steven Spielberg ou David Fincher têm sido, no essencial, geradas no coração de Hollywood. Trata-se antes de avaliar como é que as condições da sua formulação se foram transfigurando com a evolução tecnológica do cinema ao longo do século XXI e, em particular, através da proliferação de circuitos alternativos de difusão.
Uma resposta radical está nas actuais experiências do cineasta sul-africano Neill Blomkamp. Conhecemo-lo através de Distrito 9 (2009), um “thriller” futurista que experimentava algumas curiosas variações, envolvendo uma sugestiva simbologia política, sobre as relações entre humanos e extra-terrestres. O impacto comercial de Distrito 9 permitiu-lhe dirigir duas grandes produções: Elysium (2013), com Matt Damon e Jodie Foster, e Chappie (2015), com Hugh Jackman e Sigourney Weaver.
Os resultados foram francamente menos interessantes, mesmo se neles podíamos encontrar temas e elementos iconográficos que remetiam para o trabalho anterior de Blomkamp. Daí a sua decisão de experimentar uma via radicalmente independente, materializada na criação dos estúdios Oats. Primeiro objectivo: a produção de curtas-metragens apostadas em retomar as parábolas apocalípticas dos filmes anteriores, agora explorando matrizes narrativas menos académicas. E com uma componente essencial (pelo menos, para os títulos já disponibilizados): Blomkamp oferece os filmes aos espectadores na Internet.
A primeira dessas curtas-metragens chama-se Rakka e conta com Sigourney Weaver e Eugene Khumbanyiwa (actor do Malawi já presente nos filmes anteriores de Blomkamp). Trata-se de uma saga de 20 intensos minutos, retratando os sobreviventes do planeta Terra que combatem os invasores alienígenas que, além de terem tomado conta da maior parte do território, utilizam os humanos como cobaias para terríveis experiências de manipulação dos corpos.
E não se julgue que Rakka [ver aqui em baixo] é um filme de escassos recursos, tentando disfarçar as limitações do seu orçamento. Nada disso: Blomkamp trabalha com uma enorme equipa de efeitos especiais (observe-se o longo genérico final), afinal reafirmando a possibilidade de uma produção de grandes meios, mas não dependente dos grandes estúdios.