E eis que reencontramos o génio de Jerzy Skolimowski, nome emblemático da "nova vaga" polaca que continua a fazer filmes tão fascinantes quanto inclassificáveis — este texto foi publicado no Diário de Notícias (31 Agosto), com o título 'O espaço e o tempo'.
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Como falamos do mundo à nossa volta? Por exemplo, que aconteceria se, socialmente, começássemos a falar da televisão, não como um fenómeno de “comunicação”, mas apenas como um acontecimento de espaço e tempo? Um acontecimento que legisla o espaço — por exemplo, fazendo-nos crer que a casa do Big Brother é um território nobre de revelação dos seres humanos. Um acontecimento que organiza o tempo — por exemplo, promovendo o futebol a pontuação narrativa de todos os instantes de cada dia.
Que aconteceria se, realmente, convictamente, arriscássemos discutir o espaço e o tempo? Pois bem, descobriríamos que, em boa verdade, os grandes cineastas nunca desistiram de promover essa discussão. Não por qualquer pretensão transcendental. Bem pelo contrário: pela procura incessante de uma verdade muito básica, essa que faz com que viver em sociedade seja uma forma de gestão do espaço, um sistema de hierarquização do tempo.
Por isso, ao fazer um filme de cerca de 80 minutos que se concentra numa teia de eventos que ocorrem em “apenas” 11 minutos, Jerzy Skolimowski não está a incorrer em qualquer especulação mais ou menos abstracta e esotérica. Nada disso. 11 Minutos é um austero conto moral sobre a angústia de conhecermos os outros em espaços que variam através dos próprios olhares individuais, sobre a incerteza que advém do facto de não podermos aquietar o tempo que, ingenuamente, dizemos que medimos.
Daí que este seja um filme do mais descarnado realismo. Porquê? Precisamente porque compreendemos que as relações de poder entre os humanos se enraízam sempre em formas de gerir o espaço e o tempo. Ser realista é expor a transparência disso tudo, levando-nos a perceber que o destino não passa de uma noção retórica para lidarmos com o medo que tudo isso faz.