sábado, agosto 06, 2016

Salazar / 25 de Abril — o nome da ponte

Secção Filatélica AAC
I. Bem sabemos que a celebração revivalista do nome original da Ponte 25 de Abril — Ponte Salazar —  envolve processos cíclicos de branqueamento da história do Estado Novo e das suas componentes fascistas. Por isso mesmo, a evocação da origem histórica de tal nome corre sempre o risco de ser parasitada por formas equívocas e, no limite, anti-democráticas de nostalgia política.

II. Apesar disso, aliás, precisamente por causa disso, vale a pena referir que a democracia nem sempre tem sabido lidar com a densidade do seu próprio passado, impossível de descrever através de maniqueísmos típicos de soundbyte televisivo. Afinal de contas, a existência da ponte sobre o Tejo (incluindo o dia da sua inauguração, há 50 anos) foi vivida também como um desígnio nacional, carregado de paradoxais componentes afectivas, intensas e genuínas — sem esquecer que, no plano social, serviu também ao salazarismo para mascarar os dramas decorrentes da intensificação da guerra colonial.

III. No limite, as memórias contraditórias da ponte confrontam-nos com os silêncios do nosso débil léxico político, regularmente empobrecido pela normalização mediática de formas populistas de abordagem da nossa vida colectiva. De que falamos quando falamos de Salazar? — eis a pergunta cuja dificuldade deveríamos reaprender, partilhando essa dificuldade com aqueles que nasceram depois da ponte já ter mudado de nome.