sexta-feira, abril 15, 2016

Paul Verhoeven no IndieLisboa (1/2)

Paul Verhoeven é um dos "heróis independentes" da 13ª edição do IndieLisboa — este texto foi publicado no Diário de Notícias (9 Abril), com o título 'A independência irónica de Paul Verhoeven'.

Está quase a chegar o IndieLisboa: a 13ª edição do Festival Internacional de Cinema Independente de Lisboa decorrerá de 20 de Abril a 1 de Maio [tendo tido uma festa de antecipação, a 9 de Abril, no Liceu Camões, com música a cargo das bandas Ninaz e Pega Monstro (23h00); antes, foi exibido o filme Robocop, o Polícia do Futuro (1987), de Paul Verhoeven, o cineasta holandês este ano homenageado como um dos “heróis independentes” do certame (21h30)].
Convenhamos que os tempos mudaram. E que a celebração de Verhoeven como paradigma de “independência” constitui uma ironia de que os organizadores do IndieLisboa serão, por certo, os primeiros a ter consciência. No limite, a proposta merece ser saudada pelo modo como nos obriga a repensar os lugares-comuns que servem para classificar a actividade cinematográfica (com o aval dos mais preguiçosos discursos jornalísticos, sem dúvida).
É provável que a maioria dos espectadores que, agora, celebram a virginal independência de figuras como Verhoeven não tivesse sequer nascido quando ele surgiu, no coração de Hollywood, a dirigir essa fábula distópica sobre um polícia cruel, meio humano, meio máquina, que é RoboCop. O certo é que circulavam muitas dúvidas, éticas e ideológicas, sobre o facto de alguém que simbolizava os autores europeus e a sua independência “natural” (um cliché como qualquer outro...) surgir a assinar uma tão típica produção hollywoodiana.
Verhoeven teve a sagacidade de passar da “arte” europeia para a “indústria” dos EUA mantendo a ligeireza de quem vê o cinema como um exercício mais ou menos lúdico, impulsivo, de pueril provocação. Ainda na fase holandesa, o seu filme mais famoso, Delícias Turcas (1973), centrado numa “love story” mais ou menos escatológica, foi o símbolo fundador do seu estilo — uma espécie de versão caricatural de O Último Tango em Paris (1972), sem a densidade perturbante do original, mas capaz de ecoar as convulsões de usos e costumes da época (entre nós, no pós-25 de Abril, foi um dos fenómenos das novíssimas salas do Quarteto, sob a direcção de Pedro Bandeira Freire).