sexta-feira, abril 08, 2016

Jornalismo & verdade

A evocação da saída de Dan Rather da CBS está na base de um brilhante filme na tradição "liberal" de Hollywood — este texto foi publicado no Diário de Notícias (5 Abril), com o título 'Pedagogia cinematográfica'.

De Os Homens do Presidente (1976), de Alan J. Pakula, a O Caso Spotlight (2015), de Tom McCarthy, a produção americana tem mantido uma atenção regular, eminentemente pedagógica, aos bastidores da actividade jornalística. Em boa verdade, as suas raízes estão nos anos 50/60 e no chamado “cinema liberal” (designação que importa não confundir com qualquer lógica partidária) de que um cineasta como Richard Brooks, autor de O Falso Profeta (1960), poderá ser um modelo exemplar.
O caso de Verdade, brilhante título de estreia de James Vanderbilt, é tanto mais significativo quanto nos ajuda a perceber que estamos perante uma tradição que não se confunde, de modo algum, com a promoção “heróica” do jornalista apenas porque esteve a alguns metros do local onde explodiu uma bomba (como pudemos observar a pretexto dos recentes atentados em Bruxelas, esta descrição está longe de ser exagerada).


A odisseia de Dan Rather (Robert Redford) e da produtora Mary Mapes (Cate Blanchett) é mesmo um caso sintomático do modo como a prática jornalística, ainda que conduzida pelo desejo de verdade, se pode enredar num labirinto comprometedor. Os equívocos gerados pela divulgação de informações sobre o passado militar de George W. Bush (no programa 60 Minutos, da CBS) acabam por desembocar numa actualíssima interrogação. A saber: como é que o jornalismo televisivo produz efeitos de verdade?
A presença de Robert Redford como actor justifica também a evocação do seu trabalho como realizador, em especial no admirável Quiz Show (1994), centrado na saga de um concurso televisivo viciado, em finais da década de 50. Num caso como noutro, trata-se de observar como os protagonistas televisivos são marcados pela ambivalência de qualquer forma de exposição pública.