1. Podemos ter uma opinião mais ou menos admiradora, mais ou menos severa, sobre o que foi, e como foi, Marcelo Rebelo de Sousa enquanto comentador político — e não posso deixar de recordar que, como espectador, sempre me senti distante das matrizes do seu discurso (o que implicava também resistir às formas de demonização "televisiva" da própria pessoa que alguns tentaram utilizar durante a campanha presidencial).
2. Importa reconhecer que a aproximação da sua tomada de posse como Presidente da República tem sido vivida pelo próprio de forma serena, através de uma óbvia e salutar distanciação de qualquer modelo de comentário crítico (mais ou menos televisivo) sobre a actual conjuntura política. O que, repare-se, não tem impedido que a sua imagem seja apropriada pela imprensa "cor-de-rosa" de forma tão simplista quanto demagógica.
3. Esta capa é sintomática de um défice discursivo que, estranhamente ou não, tem sido protagonizado pela classe política ao longo das décadas de consolidação da democracia portuguesa. A saber: o abandono do significante "povo" como elemento fulcral da própria percepção política da nossa existência colectiva. É a imprensa dos "famosos", com todo o seu maniqueísmo sociológico e demagogia emocional, que se arvora o direito de utilizar o "povo" como elemento do seu discurso — assim vai o populismo à portuguesa.