terça-feira, dezembro 29, 2015

Que cinema europeu?

Esta é a estatueta dos Prémios do Cinema Europeu... mas quem ouviu falar neles? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (25 Dezembro), com o título 'Que Europa?'.

Pensemos no mais solitário espectador de televisão, algures no continente europeu, longe de qualquer centro urbano, dependente do seu pequeno ecrã para saber como vai o mundo... E formulemos uma pergunta rudimentar: será que esse espectador tem conhecimento da estreia do episódio VII da saga Star Wars? Mesmo sem a ajuda de qualquer estudo sociológico feito por uma dessas “agências de comunicação” que conseguem enviar 57 mails por dia sobre coisa nenhuma, atrevo-me a responder afirmativamente — em boa verdade, creio que esse espectador sabe mais sobre a herança cinematográfica de Han Solo do que sobre os dramas ponderados na recente cimeira dedicada aos problemas do clima.
Pensemos ainda no mesmo espectador e perguntemos o que é que ele sabe — ou melhor, que informação lhe chegou — sobre os prémios da Academia de Cinema Europeu que consagraram o filme A Juventude, do italiano Paolo Sorrentino? Mesmo correndo o risco de alguma precipitação estatística, atrevo-me a supor que ele nem sabe da existência de tais prémios.
Enfim, peço-vos que não confundam estas observações com um qualquer panfleto anti-americano para fazer furor nas zonas mais miseráveis das redes “sociais”. Além do mais, simpatizo com o modo como o novo Star Wars recupera a herança de George Lucas e há muitos anos que considero (e tenho escrito) que falta à Academia de Cinema Europeu uma estratégia mais elaborada e convincente (e, por certo, mais dispendiosa) de promoção dos filmes do nosso continente.
A questão que aqui relanço é de outra natureza. Aliás, do meu ponto de vista, ela permaneceria mesmo que o novo Star Wars fosse uma avalanche de mediocridades e o cinema europeu um prodígio de marketing. Acontece que vivemos numa Europa audiovisual saturada de discursos de exaltação da nossa “cultura” e carente da mais básica atenção aos respectivos produtos. E até estou a usar a linguagem dos profissionais do marketing: é que eles já não dizem “filmes”, mas “produtos”...