sábado, outubro 31, 2015

Bradley Cooper em pose de "chef"

Através de mecanismos mais ou menos perversos, há filmes condenados à partida pelo próprio mercado: À Procura de uma Estrela constitui mais um exemploo esclarecedor — este texto foi publicado no Diário de Notícias (22 Outubro).

O filme chama-se entre nós À Procura de uma Estrela, mas nada tem a ver com celebridades de Hollywood (nem com essa degradação jornalística das estrelas que são os “famosos” da telenovela). No seu centro está Adam Jones, cozinheiro ultra-dotado, “chef” de prestígio, que tenta reconstruir a sua vida depois de um dramático período de toxicodependências várias. E, de facto, o seu objectivo é obter mais uma estrela do guia Michelin para o seu restaurante...
Tais atribulações bastarão para compreender que este é um filme que escapa aos modelos correntes, não tendo super-heróis mais ou menos ruidosos, nem se parecendo com a agitação visual de um jogo de vídeo. De tal modo que até os seus produtores, os perspicazes irmãos Weinstein (da Weinstein Company), não têm sabido muito bem o que fazer com tão insólito objecto, primeiro chamando-lhe Adam Jones e, depois, emendando para Burnt (num trocadilho com a palavra “queimado” que, no mínimo, cheira a esturro).
Há outra maneira de dizer tudo isto (e é um pouco triste): cada vez que aparece um filme sustentado pelo mais sóbrio classicismo — com personagens realmente humanas e privilegiando o trabalho dos actores —, os mercados globais parecem desconhecer os ingredientes porque, em boa verdade, deixaram de ter estratégias sólidas para defender aquilo que, afinal, tem as suas raízes no mais nobre património de Hollywood.
Não é um filme sobre gastronomia, mas sim um sólido estudo psicológico, competentemente dirigido por John Wells (que conhecemos, por exemplo, através do magnífico Um Quente Agosto). E convém acrescentar que o protagonista, Bradley Cooper, está muito longe de poder ser reduzido ao registo cómico de A Ressaca (2009) e respectivas sequelas. Se dúvidas ainda restarem sobre o seu talento, observem-se as nuances da sua composição de Adam Jones, sobriamente acompanhado pela sempre brilhante Siena Miller. Aliás, não deixa de ser desconcertante que, na sua estratégia de lançamento do filme, os Weinstein nem sequer joguem o mais básico trunfo cinéfilo: é que o par Cooper/Miller já tinha dado provas concludentes num filme chamado Sniper Americano (2014), de um tal Clint Eastwood.