terça-feira, agosto 18, 2015

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C Duncan

Chama-se C Duncan, é escocês, e pelo seu álbum de estreia passam canções de travo pastoral e sabor “dream pop” que servem de perfeita banda sonora para estes dias quentes.

Quando se fala no esbatimento de velhas fronteiras entre as tradições da música clássica e os espaços da música popular não devemos escutar apenas exemplos como os que, através de nomes como os de Bryce Dessner (dos The National), Richard Reed Parry (dos Arcade Fire) ou Johnny Greenwood (dos Radiohead), revelam outros universos de referências e exemplos de criação diferentes daqueles a que habituaram parte dos seus seguidores ao apresentar obras suas em programas de música orquestral ou a gravar discos por etiquetas como a Deutsche Grammophon. Há também percursos feitos num outro sentido do mesmo vasto canal de troca de ideias e experiências. E C Duncan (n. 1989), filho de pais com trabalho feito nos universos da música clássica, com educação feita na Royal Scottish Academy of Music (que hoje se apresenta como Royal Conservatoire of Scotland), onde estudou composição, e um início de carreira que viu peças por si compostas a ser interpretadas por vários ensembles em salas de concerto do Reino Unido, apresenta agora um álbum de canções pop que revela não apenas um saber cuidado na construção das canções mas, sobretudo, uma soberba mão-cheia de momentos saborosos que convidam a fazer de Architect um dos mais recomendáveis candidatos a ser o disco-surpresa deste verão.

Tal como em 2012 descobrimos em Diver, o segundo álbum dos norte-americanos Lemonade, e, há cerca de um ano, saboreávamos no álbum de estreia dos Teleman (um novo nome pelo qual se passaram a apresentar os britânicos Peter and the Pirates), Architect é o disco certo na hora certa. Contudo, mais do que qualquer um deles, C Duncan mostra aqui qualidades e um potencial que, tendo a sorte de ser escutado, certamente transformará em novos passos uma carreira que pode ir mais longe.

As canções, que revelam tanto aquela sensação solarenga do fim de tarde quente, como a presença próxima da brisa da maresia, que escutam ecos da folk e de uma alma pastoral mas seguem também os rumos de uma certa dream pop contemporânea, não escondem sonhos de cor e luz (que certamente não haverá em Glasgow) e de uma ordem e arrumação (que nem sempre se traduz na arquitetura e urbanismo das nossas cidades). Nasceram todas elas no quarto do próprio músico, gravadas em etapas, instrumento após instrumento, assegurando o primor de uma discreta mas arrumada produção uma limpidez que faz de Architect um ciclo de canções de formas bem nítidas e sedutoras.

Arranjos bem estruturados, com uma rara variedade de cores instrumentais (dos registos acústicos ao labor elétrico e eletrónico), uma procura de texturas que desenham cenários mas não sufocam a escrita e uma segura prestação vocal que junta vários episódios de cativantes harmonizações fazem de Architect um daqueles raros discos capazes de convocar toda uma série de escolas e memórias sem perder a noção que define banda sonora para uma música do presente. Imaginem se um encontro entre as delicadas cenografias de uma Julianna Barwick, os retratos de praia e sol de um Brian Wilson surgissem nos sonhos de um jovem escocês que, pela música, conseguia sonhar uma fuga ao cinzento plúmbeo que assombra Glasgow. Architect revela um compositor de primeira água e dá-nos 12 canções que servem verdadeiros sonhos de verão para quem acreditar que a banda sonora dos dias mais quentes do ano não é coisa a confiar DJ formatados aos sabores da saison.