domingo, julho 12, 2015

Praça Sintagma, Grécia, 2015

Como é que, televisivamente, vemos a Grécia? Ou ainda: como é que as palavras a descrevem, integram e representam? Perguntas mais actuais do que nunca — este texto foi publicado no Diário de Notícias (10 Julho), com o título 'Notícias da Praça Sintagma'.

A crise na Grécia é também uma crise televisiva. Repare-se na rotina instalada: um pivot em estúdio dá conta das últimas notícias; segue-se um directo da Praça Sintagma onde um repórter repete o que ouvimos em estúdio, por vezes com duas ou três perguntas telegráficas (com respostas no mesmo tom) a pessoas que vão a passar; regressa-se ao estúdio, com o apresentador em frente de um ecrã com algum “símbolo” da situação, eventualmente o edifício do parlamento grego (que, in loco, servira de fundo ao repórter); a abordagem termina com um “especialista” em estúdio, garantindo-nos que o apocalipse está perto.
Provavelmente, está mesmo. Mas passámos a olhar para todas estas peripécias como um rudimentar e previsível jogo de vídeo. Não é, entenda-se, um fenómeno específico deste ou daquele canal, antes uma matriz formatada que, em todos os países, parece ilustrar o conceito triunfante de “globalização”.
Até mesmo as manifestações nas ruas de Atenas, antes e depois do referendo, satisfazem uma lei implícita nas práticas televisivas dominantes, esteja em jogo a politica, o futebol ou a religião: as imagens de multidões passaram a constituir matéria obrigatória de todos os dispositivos informativos, como se qualquer ajuntamento mais ou menos ruidoso funcionasse como uma prova de verdade que, por si só, contamina a notícia com uma “transcendência” que não carece de explicação.
Em 1964, nos seus Elementos de Semiologia, Roland Barthes dizia que, na linguagem, os sistemas fortes (e dava o exemplo do código da estrada) possuem sintagmas fracos; ao mesmo tempo, os grandes complexos sintagmáticos (como a imagem!) tendem a produzir sentidos ambíguos. Tudo isso parece pertencer à história... Chegámos a um ponto em que a gestão correntes das imagens (e sons) apenas procura o clímax efémero de um spot publicitário. Talvez que Alexis Tsipras seja alguém que, ao contrário da tradicional esquerda socialista, compreendeu esta nova estética dos instantes — em qualquer caso, está a ganhar.