quinta-feira, outubro 09, 2014

Revisitando Drácula (1/2)

[1958]
A estreia de Drácula: a História Desconhecida surge, aqui, como pretexto para revisitar algumas referências emblemáticas na história cinematográfica dos vampiros — este texto foi publicado no Diário de Notícias (5 Outubro), com o título 'As aventuras de Drácula no país do cinema'.

Para o melhor e para o pior, muitos títulos da produção de Hollywood das últimas décadas têm nascido de diversas formas de recuperação de grandes referências clássicas. Isso é particularmente nos domínios da aventura, envolva ela super-heróis que protegem as grandes metrópoles ou exploradores de planetas de outras galáxias.
O exemplo de Drácula: A História Desconhecida (em exibição) aí está como mais uma aposta na recuperação dos filmes de vampiros, directa ou indirectamente influenciados pelo romance gótico Drácula, de Bram Stoker, cuja primeira edição data de 1897. Neste caso, trata-se mesmo de propor um novo relato das origens do inquietante Conde Drácula ou, mais exactamente, do príncipe Vlad, da Transilvânia: ao estabelecer um pacto com as forças do Mal, ele vai ser amaldiçoado por uma violenta atracção pelo sangue dos humanos...
Seja como for, a tradição do filme de vampiros está muito longe de ser um exclusivo da produção americana. Bastará recordar Nosferatu (1922), de F. W. Murnau, símbolo nuclear do expressionismo alemão e, mais do que isso, referência obrigatória entre os grandes clássicos do período mudo. Ainda assim, o núcleo “fundador” do género de vampiros pertence à produção dos EUA, mais concretamente aos estúdios da Universal.
Foi com o primeiro Drácula (1931), interpretado pelo mítico Bela Lugosi, sob a direcção de Tod Browning, que a Universal deu origem a uma tradição que, de uma maneira ou de outra, tem vindo a manter ao longo das décadas — algumas notícias provenientes da imprensa especializada de Hollywood, referem mesmo o novo Drácula: A História Desconhecida, também com chancela da Universal, como uma nova tentativa de revitalização daquela tradição.
[2014]
Em todo o caso, para várias gerações de espectadores, o filme de vampiros foi entendido, sobretudo, como um fenómeno genuinamente britânico, ligado à produção da Hammer Films, estúdio que se especializou em temas do fantástico e do terror. O seu símbolo mais forte é a figura lendária de Christopher Lee (n. 1922). Nas décadas de 1950/60, quase sempre sob a direcção de Terence Fisher — por exemplo, em O Horror de Drácula (1958) e Drácula, Príncipe das Trevas (1966) —, Lee foi a encarnação perfeita de um “príncipe dos vampiros” em que a ameaça surgia sempre atenuada pela pose de gentleman. Curiosamente, para os espectadores mais jovens, ele será, sobretudo, o intérprete do mago Saruman, nos filmes de Peter Jackson (O Senhor dos Anéis, O Hobbit) inspirados em J. R. R. Tolkien.
Há muito que os filmes de vampiros atraíram também a sua própria paródia — recorde-se, por exemplo, que foi ainda a Universal a produzir, em 1948, a comédia Abbott e Costello e os Monstros, com a célebre dupla Bud Abbott/Lou Costello a ter alguns encontros hilariantes com Drácula e também com o monstro de Frankenstein (outra das figuras do património de terror do estúdio). Em todo o caso, o exemplo mais popular da “comédia-de-vampiros” tem assinatura de Roman Polanski e o mais sarcástico dos títulos: Por Favor, Não Me Morda o Pescoço (1967).
Em tempos mais recentes, os dois títulos de maior impacto têm assinatura de cineastas veteranos. São eles Drácula de Bram Stoker (1992), de Francis Ford Coppola, e Entrevista com o Vampiro (1994), de Neil Jordan. Ambos reflectem uma vontade de retorno à inspiração literária da mitologia dos vampiros: o primeiro, como o título esclarece, regressando ao livro original; o segundo inspirando-se no primeiro título das popularíssimas “Crónicas de Vampiros” escritas por Anne Rice.