sexta-feira, outubro 31, 2014

Pulp: o elogio da gente comum


A dada altura, já a meio do filme, Jarvis Cocker explica-nos que a fama é um pouco como ser levado de repente e deixado ali algures, a meio de Portugal... Sem capacidade para fazer nada do que antes fazia... A verdade é que souberam encontrar caminho. E depois do impacte colossal de Different Class, álbum que os consagrou como figuras maiores da pop dos anos 90 mas, ao mesmo tempo, os levou a lugares e companhias que não desejavam – assim o explicam – responderam fazendo o disco que seria o oposto do esperado. Na verdade fizeram dois nesses termos. E por marcante – musical e sociologicamente - que tenha sido Different Class, a verdade é que o melhor da obra dos Pulp surgiu mesmo entre This Is Hardcore (1997) e We Love Life (2001), este último criado com Scott Walker como produtor.

O filme Pulp: Um Filme Sobre a Vida a Morte e os Supermercados não quer ir por aí. Ou seja, não parte em busca de um percurso musical, nem tenta colher frutos do que uma carreira longa – e nem toda ela bem conhecida do grande público nos deixou. Nada contra. Há artigos de jornais e revistas para o fazer. Florian Habicht procurou antes a ocasião de uma digressão de reencontro (para um prometido ponto final) e, em concreto, uma passagem pela sua cidade natal de Sheffield, para à sua volta procurar cenas de vida, de morte e de supermercados (onde em tempos Jarvis Cocker trabalhou)... Pena que tenha sentido a necessidade de andar atrás da banda, um a um, entre entrevistas arrumadas entre olhares de bastidores e palco e que tenha deixado escapar o grande filme que ali tinha debaixo dos olhos: um filme sobre a fama e os fãs. E que fãs!


O melhor do documentário que recentemente estreou no Doc, terá breve vida em sala e chega também ao DVD, mora precisamente nas sequências em que admiradores dos Pulp discutem ou a sua música ou o seu relacionamento com as suas próprias vidas. O momento em que uma mulher lê a letra de Help the Aged e, depois, um bar cheio de idosos a transforma em canção dá conta desse filme que poderia ter acontecido. A “gente comum” aqui é quem brilha e mais de novo ou diferente tem que nos dizer. Afinal porque não escutou o realizador a canção que lhe podia ter dado a pista certa?

Apesar do muito que Jarvis Cocker e colegas têm para nos contar e das belíssimas sequências de palco que vemos, o documentário por vezes descola, mas sistematicamente regressa àquele naipe habitual de elementos que fazem tantos outros making of e afins que vemos como extras em DVDs.