segunda-feira, outubro 06, 2014

Novas edições:
Prince

Prince
“The Art Official Age”
3 / 5

Que Prince é um dos mais espantosos músicos do nosso tempo ninguém duvida. Basta vê-lo em palco para sentir que respira e transpira uma peculiar relação com a guitarra, o funk, o canto. E bastava o lote de álbuns (todos eles irrepreensíveis e merecedores de cinco “estrelas”) que lançou entre 1999 (ou seja, 1982) e Sign of The Times (1987) para justificar a inscrição do seu nome entre os maiores vultos da história da música popular. É verdade que Prince não esgotou a inspiração em Sign of The Times, e álbuns como Lovessexy (1988) ou o mais desigual Diamonds and Pearls (1991), assim como o disco que criou inspirado pelo Batman de Tim Burton em 1989 ou os mais recentes Musicology (2004) e 3121 (2006), são momentos dignos de inscrição entre os episódios melhores de uma obra que, desde 1978, somou já uma impressionante extensão de discos, entre os que lançou em nome próprio e as colaborações que aqui e ali foi assinando. Mas não é menos verdade que nunca, depois desse álbum histórico de 1987, alguma vez lançou um disco que retomasse o patamar de rara excelência no qual caminhara desde 1982. Pelo contrário, houve até momentos discograficamente menores, assim como questões extra-musicais que diluíram a focagem das atenções na sua obra. Mesmo assim a sua aura e reconhecidas capacidades performativas mantiveram o seu nome longe dos espaços de consumo de nostalgia fácil (onde circulam muitos dos seus contemporâneos), o que faz com que cada novo concerto e lançamento em disco sejam sempre episódios mediaticamente vibrantes. Mesmo quando, depois de escutados os discos, acabamos por notar que o plano em quem definiu os melhores instantes da sua obra parece, cada vez mais distante. Prince é, todavia, e um pouco como Woody Allen, um criador que, mesmo em momentos menos inspirados, nunca resvala abaixo de um nível do que entendemos como “bom”. Este ano, concedendo expressão em disco a uma etapa de entendimento com um novo coletivo de instrumentistas com quem tem trabalhado, resolveu editar dois álbuns em simultâneo. Num deles partilha o protagonismo com as 3rdeyegirl. Aqui, em The Art Official Age, ele é quem está no centro gravítico de todas as atenções. Não apenas porque assina todas as composições (o que faz, de resto, em ambos os discos) ou porque a sua voz e marcas de identidade estão claramente visíveis mas também porque, mais que nunca entre os seus discos pós-anos 90 ouvimo-lo aqui e ali a procurar ecos do que são as suas memórias dos anos 80 num alinhamento que alarga horizontes a várias experiências, ensaiando mesmo ideias mais invulgares como as que mostra em Funkroll (onde procura pontes entre a sua visão minimalista dos oitentas e a presença das guitarras e uma surpreendente contaminação electrónica e nos dá a sua melhor canção desde Cream), no espaço cinematográfico para orquestra e spoken word de Affirmation III ou no divertimento electrónico, com temperos de eletro e hip hop e cenografia coral que escutamos no tema-título. Entre os temas que fazem o corpo do álbum encontramos algumas das suas melhores canções dos últimos anos mas, tal como em toda a sua discografia posterior a 1990, há entre o disco canções algo inconsequentes que nada lhe acrescentam. Mesmo assim está aqui o seu melhor álbum desde 3121... O que, em tempo de regresso à editora onde começou a carreira e lançou os seus melhores discos, não parece nada mau.