Cult Records
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Na aurora do milénio os Strokes anunciavam o reencontro das atenções do mundo (indie) com a música elétrica made in Nova Iorque. Estabelecendo ligações diretas com memórias das escolas de 70 que da cidade chegaram depois ao mundo via CBGB e outros palcos, o álbum de estreia dos Strokes brilhava porque não se limitava a propor um exercício de mascarada nostálgica. Trazia de facto grandes canções, um sentido de atualidade no seu discurso e transportavam a carga de quem nascera e crescera sobre as memórias que ali eram tomadas como genética na base de todo o edifício musical. Depois houve um segundo álbum em registo mais-do-mesmo (mas com uma nova bela coleção de canções) e ainda um terceiro, o belíssimo First Impressions of Earth, onde se levantavam hipóteses de novos caminhos. A pulverização do grupo em projetos paralelos e a medíocre discografia que editaram desde então deixou sombrias nuvens sobre o grupo que, a menos que estejamos todos enganados, arrumou nos seus três primeiros álbuns o que de interessante nos tinha para contar. Dividindo muitas opiniões o álbum de estreia a solo do vocalista Julian Casablancas – Phrazes For The Young, de 2009 – aproveitava algumas sugestões do opus 3 dos Strokes, juntava sintetizadores vintage e um sentido pop acridoce para mostrar para onde a coisa poderia ter ido em grupo (sim, gostei muito do álbum)... Mas agora, cinco anos depois dessa experiência promissora e um ano após uma colaboração com os Daft Punk que assentou que nem uma luva num álbum que se afirmou como um dos casos de popularidade maior de 2013 (mas que de todo não representa o melhor do duo francês), eis que Julian Casablancas regressa com um segundo álbum que prefere assinar em conjunto com os The Voidz, a banda que agora o acompanha. Tyranny não é contudo nem um sucessor natural do álbum a solo de 2009 nem uma derivação ou reencontro com o terreno “clássico” dos Strokes. É, como diriam os Monty Python, algo completamente diferente. O que pode ser bom ou nem por isso. E na verdade é mais o segundo caso. Se por um lado o disco promove um alargamento de horizontes que vão da assimilação de heranças do punk de segunda geração (Black Flag e afins) a uma mais evidente presença de teclados com sabor vintage, traduzindo o que parece ser um olhar crítico e irado sobre o nosso tempo, ocasionalmente resultando em propostas convidativas e desafiantes (como sucede ao som de Nintendo Blood ou Take Me In Your Army), a verdade é que muito do alinhamento parece mais uma coleção de ideias à espera de arrumação que um conjunto de canções com a solidez que a obra de Casablancas já antes nos mostrou. Human Sadness, o longo épico de dez minutos que foi cartão de visita do álbum, dava conta de um mundo vasto de ideias em jogo. O álbum, contudo, peca por não as aproveitar devidamente.