segunda-feira, setembro 29, 2014

Sinais dos tempos (televisivos)

Futebol, meteorologia ou os horrores da Casa dos Segredos: a televisão é um universo normativo que não se reconhece — esta crónica de televisão foi publicada na revista "Notícias TV" (Diário de Notícias), com o título 'Sinais dos tempos'.

1. No final do empate a uma bola entre Manchester City e Chelsea (Benfica TV), os adeptos do Chelsea aplaudiram calorosamente Frank Lampard. Surpresa? Não exactamente. Afinal de contas, ele é uma das lendas vivas do clube e um dos jogadores mais queridos dos adeptos da equipa treinada por José Mourinho. Em todo o caso, importa lembrar que Lampard já não está no Chelsea: mudou-se para os EUA, para o New York City Football Club, tendo regressado por alguns meses a Inglaterra através de um empréstimo ao... Manchester City. Além do mais, convém ainda referir que o Chelsea esteve a ganhar até cinco minutos do fim, tendo o City conseguido empatar através de um golo marcado por... Lampard! A atitude dos adeptos do Chelsea é um exemplo cristalino de fair play [video: comentário de José Mourinho] que, pelo que me foi dado ver, não encontrou ecos muito significativos nas televisões. Não mereceu, pelo menos, as dezenas de repetições com que continuam a ser tratados os “polémicos” lances de cada fim de semana lusitano. Dito de outro modo: os privilégios informativos (?) vão para tudo o que possa alimentar centelhas de conflito no universo do futebol. Bem pelo contrário, qualquer evento que reflicta um entendimento pacifista do futebol e das suas relações humanas é secundarizado, quando não liminarmente ignorado.


2. A generalização de algumas formas de linguagem “especializada” é um bizarro sinal de formatação cultural. O futebol, com os seus golos “contra a corrente do jogo” e outros admiráveis delírios é, nesse aspecto, um manancial de retórica. Mas a meteorolgia não lhe fica atrás: passámos a viver num universo de “alertas” de várias cores, a ponto de o conhecimento ou desconhecimento da aproximação de mau tempo poder ser pretexto para tempestuosos conflitos institucionais.

3. Em a Casa dos Segredos (TVI), diz-se (e está escrito no respectivo site): “Somos um falso casal lésbico”. Quando tudo é falso, tudo é permitido — eis a democracia que importa questionar.