segunda-feira, setembro 08, 2014

A demissão de Paulo Bento

[SIC Notícias]
1. O síndroma Paulo Bento já não é essa autocomplacência que praticamos há muitos anos, enquistados na ideia (?) de que somos os melhores do mundo, só que, azar dos azares, vamos perdendo... E faço questão em sublinhar que o meu pessimismo não decorre da derrota com a Albânia, a meu ver normalíssima, isto é, confirmando o que já escrevi várias vezes ao longo dos últimos anos: o futebol da selecção portuguesa é uma manta de retalhos que começou a degradar-se, não depois da epopeia "nacionalista" de Luís Filipe Scolari (com bandeiras a apodrecer em janelas de todo o país...), mas com o vazio de ideias que o próprio Scolari instalou na equipa, metodicamente disfarçado por um discurso de demagógica exaltação afectiva. Tudo isso seria apenas anedótico, não se desse o caso de, nos mais variados contextos (por exemplo, no Euro 2012), se instalar uma histeria mediática que explora um "patriotismo" pueril, exponenciado até à mais violenta obscenidade.

2. O síndroma Paulo Bento nasce da inadequação do real às pobres utopias com que alimentamos (ou nos fazem alimentar) as nossas ilusões. Hélas! O real, esse impossível, é ingrato! Assim, volta-se a "explicar" uma derrota (primeiro João Moutinho, logo a seguir o próprio Paulo Bento) lembrando que o adversário, coitado, só teve uma oportunidade, mas marcou um golo... Isto, claro, acrescentando que a equipa portuguesa acumulou oportunidades atrás de oportunidades, só que lhe faltou esse pormenor irrelevante que consiste em marcar golos... Não creio que a demissão de Paulo Bento do cargo de seleccionador pudesse resolver os dramas internos do futebol português — com clubes que vivem da gestão de direitos televisivos e das tácticas pouco futebolísticas de poderosos empresários, não é da pessoa que ocupa o cargo de seleccionador que depende a solução seja do que for. Em todo o caso, a demissão de Paulo Bento talvez nos ajudasse, pelo menos, a praticar outro discurso para lidar com as mais cruas evidências. Exemplo? Portugal, 0 - Albânia, 1.

3. Próximo episódio: Cristiano Ronaldo, arauto do nosso génio futebolístico, há-de reaparecer para nos esclarecer que, afinal, está tudo mal... Agradecemos, desde já, a atenção.