Com O Salão de Jimmy, Ken Loach prolonga a saga realista do seu cinema, evocando a Irlanda entre os dois conflitos mundiais — este texto foi publicado no Diário de Notícias (22 Agosto), com o título 'Impasses do realismo'.
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Sou dos que pensam que o cinema de Ken Loach nunca ganhou em aventurar-se nas chamadas “reconstituições” históricas. O filme com que venceu o Festival de Cannes — Brisa de Mudança (2006) — parece-me mesmo um dos exemplos mais académicos da sua trajectória. Há algo de semelhante em O Salão de Jimmy, quer dizer, uma espécie de polimento “formal” que aproxima a evocação do militante comunista irlandês James Gralton (1886-1945) da lógica determinista de muitos produtos de raiz televisiva.
Claro que Loach não perdeu as suas qualidades de encenação e, pelo menos, as cenas de dança (no salão a que o título se refere) possuem a energia física e emocional que distingue um genuíno cineasta; além do mais, é sempre surpreendente observar a performance de um tão vasto lote de actores, impecáveis mesmo quando a sua função é necessariamente breve e circunstancial.
O certo é que O Salão de Jimmy nunca consegue consubstanciar aquilo que continua a ser o horizonte formal do labor de Loach: uma vibração à flor de pele que, de uma maneira ou de outra, decorre de um elaborado gosto documental. Penso, por exemplo, em O Meu Nome É Joe (1998), centrado num operário com a existência à deriva, e creio que as diferenças são sensíveis. E penso, sobretudo, na perturbante intensidade de Vida em Família (1971), um verdadeiro clássico do realismo que, agora, surge reduzido a um método apenas demonstrativo.