quarta-feira, agosto 13, 2014

Em conversa: Gonçalo Tocha (2 / 2)


Uma troca de palavras com o realizador Gonçalo Tocha a propósito do filme A Mãe e o Mar que agora circula entre alguns cineclubes do país. Esta conversa serviu de base a um artigo publicado na edição de 3 de agosto do DN.

Aquelas histórias contadas quase podiam construir uma ficção. Porque têm uma fortíssima carga narrativa. Vês o documentário como um contador de histórias?
Nem sempre o filme tem de contar histórias. E as histórias nem sempre se contam através das palavras. Eu nem costumo usar entrevistas para a câmara, porque constroem uma barreira entre a pessoa e a câmara. Agora, se tu vives o que filmas, as pessoas libertam-se e tudo pode acontecer: a autenticidade e a representação. Continuo a achar que para filmar temos de habitar os lugares, como se através do cinema, tu pudesses viver mais e melhor. Mas só resulta se tiveres tempo, vontade, dedicação e acreditares no teu instinto.

A rodagem foi longa? Ou mais concentrada que no Corvo?
Foi mais concentrada, durou um ano em três fases intercaladas. Em Vila Chã o lugar era mais estreito, e estava a filmar muito menos pessoas. O Corvo era uma rodagem sem fim, e era isso o que queria. A grande diferença é que neste filme de Vila Chã havia uma pequena produção e sendo assim há sempre um fim, mais ou menos, definido. Muda tudo.

Como se gere o volume de imagens e informação? No DVD ficou claro que houve muito material que não coube na montagem final em assim vive agora como extra. Como foi aqui?
Aqui não há muito material que ficou de fora, dentro da estrutura do filme. Há muita pesca que filmei mas feita por pescadores homens mais jovens que não tinham uma relação estreita com as mulheres pescadeiras de Vila Chã. Durante a rodagem, o meu foco foi ficando cada vez mais reduzido, mais especifico e cada vez menos coisas podiam entrar.

O que representa para ti ver este filme a ir para além do circuito dos festivais?
Pôr um filme em sala, um filme feito com um produção de 15.000 euros, é uma lança no deserto, um gesto corajoso mas também pronto ao fracasso. Não temos ferramentas para competir com as outras máquinas de divulgação, os filmes norte-americanos ou mesmo, em mais pequena escala, os filmes portugueses apoiados pelo ICA Seria mais seguro não pô-lo em sala, não se arriscava nada, ficávamos com as exibições internacionais, com o MoMA, etc. Mas os filmes são feitos para serem vistos e é nossa função abrir os canais. Levar o gesto até ao fim.