terça-feira, julho 08, 2014

Os quatro "cabeleiras" chegaram ao cinema

Este domingo passaram 50 anos sobre a estreia em sala de A Hard Day’s Night, o primeiro filme protagonizado pelos Beatles. Este texto foi originalmente publicado na edição de 6 de julho do DN.

Foi com o título Os Quatro Cabeleiras do Após-Calipso que os Beatles entraram pela primeira vez num ecrã de cinema português. O cartaz promocional acrescentava mesmo: “Cabeludos... Desgrenhados... Mas com um Ritmo dos Diabos”... A “criatividade” na hora de dar um título local ao filme não foi exclusivo português. No Brasil, por exemplo, surgiu em cartaz como Os Reis do Iê Iê Iê e na Alemanha era anunciado como Yeah Yeah Yeah (em ambos os casos claramente citando a letra de She Loves You e do movimento ié ié que ali também foi buscar o nome). Na Itália apresentava-se como Tutti Per Uno e, na França, Quatre Garçons Dans Le Vent. Com o título original A Hard Day’s Night, e sob realização de Richard Lester, a longa-metragem teve estreia mundial faz agora 50 anos e representou não apenas a primeira de uma série de incursões dos Beatles pelo cinema como resultou num dos filmes mais influentes na história do relacionamento da música pop com as imagens.

A assinalar as suas bodas de ouro o filme regressou este fim de semana às salas nos EUA, prevendo a Janus Films (que adquiriu recentemente os seus direitos) que depois haja igual nova vida para A Hard Day’s Night nas salas europeias. Uma versão restaurada do filme nos formatos de DVD e Blu-ray deverá contudo conhecer edição mundial ainda durante este mês de julho.

Estreados discograficamente em finais de 1962 e tendo conquistado um estatuto de enorme popularidade no Reino Unido em 63, os Beatles tinham entretanto saltado para a linha da frente das atenções mundiais depois de uma primeira viagem aos Estados Unidos em inícios de 64 que fizera a beatlemania atingir proporções globais. O cinema acabou naturalmente por entrar no seu caminho, tal como havia acontecido com Elvis Presley ou Cliff Richard, duas das primeiras estrelas da idade da cultura pop/rock.

Coube à United Artists a produção do filme, disponibilizando um orçamento relativamente reduzido. Não era tido como garantido o sucesso do filme, esperando a companhia com mais interesse até a edição em primeira mão (nos EUA) de uma banda sonora. Acabaram ambos por seu um sucesso, representando a hoje banda sonora americana um valor acrescentado no colecionismo dos Beatles, uma vez que apresenta um alinhamento diferente do álbum “canónico” (o britânico) então editado, onde apenas parte do alinhamento corresponde às novas canções expressamente criadas para o filme – como o tema-tílulo ou And I Love Her. A versão americana junta às canções o inédito I’ll Cry Instead (gravado para o filme mas não usado) e temas instrumentais usados entre as imagens.

Com argumento de Alun Owen, A Hard Day’s Night encontra uma trama narrativa com um tempero de aventura (que inclui o desaparecimento de Ringo e a presença de um ator que veste a pele do avô de Paul) que cruza com ecos do próprio sucesso dos Beatles e do seu trabalho como músicos. Richard Lester filmou a preto e branco e não seguiu caminhos semelhantes aos filmes de Elvis e Cliff, procurando antes explorar outras heranças mais clássicas do próprio cinema, dos Irmãos Marx a Buster Keaton, havendo quem tenha já chamado ao filme o Citizen Kane dos musicais da era das jukeboxes.