quarta-feira, maio 21, 2014

Novas edições:
Tori Amos, Unrepentant Grealdines

Tori Amos
"Unrepentant Geraldines"
Deutsche Grammophon / Universal
4 / 5

Revelada na alvorada dos anos 90 com Little Earthquakes (1991), a norte-americana Tori Amos deu há perto de três anos um passo importante na evolução da sua carreira ao assinar pela editora Deutsche Grammophon, casa sobretudo reconhecida pelo seu trabalho nos vários domínios (e tempos) da música erudita. E depois de um álbum que celebrava heranças de compositores como Chopin, Debussy ou Satie (Night of The Hunter, editado em 2011) e de um outro no qual recriava canções de duas décadas de discos em novos arranjos orquestrais (Gold Dust, de 2012), eis que regressa agora à alma central da sua obra, apresentando em Unrepentant Geraldines um novo disco de estúdio feito de temas originais.

Unrepentant Geraldines surge depois de finalmente estreado o musical The Light Princess, composto pela própria Tori Amos e que, em 2015, terá edição em disco com o elenco que assegurou a sua vida em palco. Mas o mais importante estímulo que conduziu Tori Amos a estas canções foi o aprofundar da sua relação com as artes visuais. Um esboço de Daniel Maclise, uma fotografia de Diane Arbus ou uma ilustração de Dante Gabriel Rossetti inspiraram respetivamente canções como Unrepentant Geraldines, America ou Maids of Elfen-Mere.

Tori Amos faz contudo questão de sublinhar a importância que teve a sua relativamente recente descoberta de Paul Cézanne, que está na origem do tema 16 Shades of Blue. "Sei que levei tempo a chegar" a Cézanne, confessa na entrevista que podemos ver no DVD que acompanha o disco. "Há anos que me davam livros sobre o seu trabalho, mas eu não chegava lá... Só apanhamos as coisas quando estamos prontos para as compreender", reconhece, confessando que só recentemente conseguiu finalmente "escutar" a pintura de Cézanne. Leu então tudo o que encontrou sobre o pintor e a sua obra. E deixou-se maravilhar pela forma como "saía para a natureza", e como nela conseguia ver o corpo de uma mulher.

Muito estimulado por imagens, este disco é um álbum que, mesmo que musicalmente assente sobre a já "clássica" linha central da obra de Tori Amos, é um reflexo do nosso tempo. Na entrevista que acompanha a versão especial do álbum, Tori Amos explica que tanto juntou aqui uma forma de contar histórias ao jeito de um Johnny Cash como reflete sobre questões do presente, das esferas da política às da segurança (sendo bem evidente a sua preocupação sobre as revelações recentes sobre atos de espionagem e escutas em grande escala).

America, que abre o alinhamento, traduz uma relação consciente e crítica com a sua identidade americana. "Quando entro num lugar e me escutam o sotaque já têm uma ideia de mim, como se todos os americanos fossem iguais", comenta na mesma entrevista. Tori Amos explica que há ideias feitas, por vezes "por causa de um político" e defende que os americanos deviam pensar melhor a sua terra "e como tem sido usada" e que, por isso, os mais novos devem procurar saber que papel se espera para esta mesma América no futuro.

PS. Este texto foi originalmente publicado na edição de 19 de maio do DN com o título "Tori Amos regressa com disco inspirado pelas artes visuais"