quarta-feira, outubro 23, 2013

Greta Gerwig + Nova Iorque (1/2)

Nascido em Brooklyn, Nova Iorque, em 1969, Noah Baumbach impôs-se como uma referência marcante da produção independente americana, na dupla condição de argumentista e realizador. A Lula e a Baleia (2005) valeu-lhe uma nomeação para o Oscar de melhor argumento original. Entre os seus títulos mais conhecidos incluem-se ainda Margot e o Casamento (2007) e Greenberg (2010); neste último, Greta Gerwig já participava como actriz. Na dupla condição de actriz e co-autora do argumento, Gerwig surge, agora, como a musa de Frances Ha, o mais recente trabalho de Baumbach — este texto faz parte de um dossier sobre o filme, publicado no Diário de Notícias (20 Outubro).

Greta Gerwig nasceu em Sacramento, Califórnia, a 4 de Agosto de 1983. Que é como quem diz: mesmo com a toda a jovialidade da sua imagem, os seus 30 anos colocam-na para lá de qualquer máscara juvenil. Recentemente, num perfil de Gerwig publicado pela revista Time, a jornalista Lily Rothman recordava que há uma idade fatal, os 27 anos, na história mítica da música rock: Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, Kurt Cobain e Amy Winehouse, todos faleceram com 27 anos. Em todo o caso, Gerwig colocava a questão de forma mais ligeira, considerando que essa é a fronteira a partir da qual convém evitar repetir a pergunta automática dirigida a uma visita lá de casa: “Quer ver o meu quarto?”
Ao interpretar a personagem central do filme Frances Ha (em exibição), Gerwig coloca-se no centro dessas atribulações mais ou menos privadas, ora dramáticas, ora irónicas. E tanto mais quanto o seu envolvimento no filme começa na autoria do argumento, partilhada com o realizador Noah Baumbach (seu companheiro desde 2011).
Não estamos, no entanto, perante um retrato autobiográfico. Frances Ha funciona como uma espécie de história em aberto, organizando-se como uma teia de pequenos acontecimentos centrados numa jovem que pode simbolizar toda uma vivência urbana permanentemente dividida entre a escolha de um lugar para viver e a possibilidade de conseguir um emprego estável. Assim, Frances é alguém que partilha um apartamento com Sophie (Mickey Sumner), numa relação que parece blindada contra todas as intromissões exteriores, sobretudo masculinas, até que Sophie decide mudar de casa... Ao mesmo tempo, Frances empenha-se em estudar dança (para ensinar dança?), numa atitude de cuja consistência ela própria parece ser a primeira a duvidar...
O facto de o filme ser rodado a preto e branco, com a agilidade própria de uma câmara digital de grande ligeireza, confere-lhe a ambiência de uma quase reportagem. Em qualquer caso, este não é um cinema “espontaneísta”, mesmo se, em algumas sequências, parece apostar na possibilidade de alguma improvisação por parte dos actores. Seja como for, a própria Gerwig esclareceu que a margem de improviso foi sempre reduzida, já que a câmara digital permite sempre fazer muitas “takes” do mesmo plano (por vezes, segundo ela, ultrapassando as quarenta repetições) sem aumentar de forma significativa os custos de produção.
Curiosamente, ao trabalhar no argumento com Baumbach, Gerwig não se imaginava a interpretar a personagem de Frances. Acabou por ser uma decisão resultante do próprio processo de escrita, tendo sido o realizador a sugerir tal hipótese. Para a definição dos ambientes de Frances Ha muito contribuiu o facto de Baumbach e Gerwig partilharem os mais diversos gostos musicais. Algumas canções ganharam mesmo um peso decisivo na construção de certas cenas, incluindo Rocks Off, dos Rolling Stones, Blue Sway, de Paul McCartney, e Modern Love [video], de David Bowie.