John Grant
“Pale Green Ghosts”
Bella Union / Popstock
4 / 5
Há perto de três anos o álbum
Queen of Denmark deu finalmente a
John Grant o reconhecimento que (sabe-se lá porquê) nunca bateu à porta dos The Czars, a banda onde antes militou e pela qual gravou vários discos. Foi uma estreia notável, a parceria, via editora, com os Midlake, concedendo-lhe argumentos em favor de uma atmosfera pastoral, que os arranjos engrandeceram, as canções todavia não deixando distrair pelas formas, colocando antes os dedos em velhas feridas, falando de demónios antigos, tentando de certa forma o seu exorcismo. Quase três anos depois encontramo-lo agora em
Pale Green Ghosts mais seguro de si, mais capaz de se entender com quem é e o mundo ao seu redor, sem que isso traduza um apaziguar de velhas raivas, as contas por ajustar com dores antigas, um passado de rejeição, inquietude e dependência passando bem claras, e sem filtros, ainda entre canções. Mas algo completamente diferente entra em cena: as electrónicas. Era uma vontade antiga, a de trabalhar com sons que sempre acompanharam a sua vida de melómano. E por isso rumou à Islândia (onde antes tinha atuado num festival) para desafiar Birgir Porarinsson, dos Gus Gus, para com ele desenhar os caminhos de um disco que não só herda ecos de memórias das electrónicas da geração pop de finais de 70 e inícios dos oitentas, como traduz, de certo modo, a mais direta herança (natural) dos caminhos que os Gus Gus talharam em alguns momentos do belíssimo
This Is Normal, de 1999. Apesar da luminosidade pop que brota das canções, o disco está habitado por ressonâncias de mágoa e mesmo ódio, mas expressas na forma de memórias, de relatos de experiências e até de um desejo de partilha com outros que tenham passado por situações semelhantes (como o confronto de uma educação religiosa com a sua homossexualidade, a autorrejeição, a dependência). O alinhamento abre pontualmente frestas de contacto direto com os caminhos seguidos no disco anterior, como em
Glacier ou
GMF, onde brilha mais que nunca um saber quase sinfonista nos arranjos. Porém, é da assimilaçãoo das electrónicas que vive o ritmo cardíaco de um álbum que, podendo não repetir o efeito de deslumbramento e surpresa do anterior, não deixa de ser um seguro passo na afirmação de John Grant como um dos grandes cantautores do nosso tempo.