quarta-feira, fevereiro 20, 2013

Novas edições:
Jamie Lidell, Jamie Lidell

Jamie Lidell 
“Jamie Lidell” 
Warp Records
3 / 5

A boa e velha máxima que António Variações nos cantava em Estou Além não nasceu por acaso, tantos que são os casos de almas que gostavam de ser quem não são e de estar onde não estão. Jamie Lidell podia ser um eventual caso problemático, mas resolveu bem o seu dilema. Nascido deste lado do Atlântico, com primeiros passos dados mais próximos das electrónicas (não foi por acaso que se ligou à Warp Records), foi aos poucos dando a conhecer as suas reais fontes de inspiração, que encontrava do outro lado do oceano, em memórias de uma América onde nos chegaram as escolas soul e funk que, aos poucos foi assimilando na sua música de forma todavia menos mediática (e frequentemente mais inspirada) que o seu compatriota Jay Kay nos dias de glória do coletivo Jamiroquai. A sua vida levou-o recentemente a resolver os eventuais desencontros de tempo e lugar de que falava acima. Casou, mudou-se para Nashville (que é capital country, mas sempre mora mais perto das escolas de genética R&B que o animam). E agora, num álbum a que muito simplesmente chama Jamie Lidell, veste uma pele que parece querer destacar-se dos cenários que vivemos no presente, rumando a inícios dos 80, quando as electrónicas emergiram entre terrenos funk, gerando todo um novo mundo de acontecimentos que então escutámos em discos de nomes como Prince, Cameo ou às grandes estrelas das pistas de dança de então que eram os Indeep. O novo álbum de Jamie Lidell é assim uma celebração desse corpo de referências (evocando particularmente os discos de Prince na alvorada dos oitentas), reencontrando trilhos eletro, funk e a sofisticação do som de uma pop sintetizada, de genética negra, que fez escola na época. O alinhamento abre de forma soberba ao som irresistível de I’m Selfish, ensaia com resultados interessantes um diálogo entre a canção pop e as heranças que aqui explora em You Naked, cruza uma sujidade jazzy à la Tom Waits com electrónicas mais ásperas em Why-ya-why e visita o minimalismo eletro funk como o faziam os Indeep em Do Yourself a Favour, canção cuja paleta sónica podia enganar uma máquina do tempo (nem faltam as vozes processadas ao jeito de um vocoder). Contudo, se formalmente o exercício de revisitação deste soberbo corpo de heranças parece traduzir um gosto aprimorado por anos de escuta de discos e um saber técnico e instrumental que os álbuns anteriores de Lidell já tinham afirmado (este todavia valorizando mais que nunca o seu esforço pessoal em várias frentes do trabalho de escrita, interpretação e gravação), já no departamento da composição a luz não abençoou estas canções com a mesma intensidade. Acabamos assim com uma mão cheia de temas onde as formas são de evidente primor técnico, mas na verdade nem sempre acabam por acrescentar ao trabalho das ferramentas.