A Internet viciou-nos num perverso exercício de memória em relação a muitas imagens. Ou melhor: um exercício de memória perversa. Porquê? Porque passámos a lidar também com as imagens que, por uma razão ou por outra, foram rejeitadas pelos seus protagonistas — são imagens que, num certo sentido, nunca existiram.
Sintoma curioso, desconcertante e, por vezes, quase surreal de tal fenómeno é a regularidade com que vão emergindo as imagens não utilizadas de um determinado portfolio. De facto, passou a ser frequente a difusão das chamadas outtakes de determinadas sessões mais ou menos célebres pelos seus resultados figurativos. São imagens "imperfeitas" cuja amostragem pode até não ter a autorização dos respectivos fotógrafos (ou fotografados), mas instalam sempre uma sensação bizarra: não tanto pelo "erro" que podem ostentar, mas porque nos fazem perceber que as escolhas feitas deram origem a uma iconografia precisa, porventura estranha ao ambiente ou sensibilidade dessas mesmas outtakes.

Ironia conhecida, mas que a "nova" imagem esclarece: Ritts fotografou Madonna, não num espaço mais ou menos grandioso, mas frente a... uma parede — era Hitchcock que dizia que, por vezes, para se conseguir filmar um grande plano de um beijo sensual, numa situação de intensa intimidade, o melhor era colocar os protagonistas de joelhos, em cima de uma mesa...