quinta-feira, outubro 18, 2012

A televisão segundo Aaron Sorkin

Grande acontecimento televisivo: uma série, The Newsroom, que arrisca discutir as leis internas (e externas) da própria televisão — este texto foi publicado no Diário de Notícias (12 Outubro), com o título 'Histórias de jornalistas'.

Primeira pergunta: será que, de um modo geral, as televisões arriscam problematizar e pensar as questões que decorrem das linguagens que utilizam?
Segunda pergunta: será que, de um modo geral, as televisões se mostram disponíveis para reflectir sobre as linguagens dominantes nos seus espaços de informação?
Terceira pergunta: será que, de um modo geral, as televisões costumam adoptar uma atitude construtiva no sentido de avaliar os seus efeitos na comunidade de espectadores?
As minhas respostas a estas perguntas são, há muitos anos, as mesmas: 1) – não; 2) – não; 3) – não. Nada disto envolve qualquer demonização seja de quem for (indivíduo ou entidade). E proclamar que alguns críticos estão “contra a televisão” é apenas uma forma de demagogia com que alguns insistem em iludir o fundamental papel social da televisão.
Acontece que pensar a televisão como sistema de linguagens é algo que nunca foi estranho à própria... televisão. O exemplo mais recente dessa capacidade está na admirável série da HBO, The Newsroom (canal TV Séries), criada e, em grande parte, escrita por Aaron Sorkin [foto], criador multifacetado, responsável pela série Os Homens do Presidente, “oscarizado” pelo seu argumento para A Rede Social, de David Fincher.
Como o título sugere, trata-se de abordar o dia a dia de uma redacção televisiva, num canal de informação por cabo, tendo como personagem nuclear o “pivot” e editorialista Will McAvoy (interpretado pelo excelente Jeff Daniels). O mínimo que se pode dizer é que The Newsroom sabe colocar em cena essa tensão que se estabelece entre a facilidade da especulação informativa e a exigência extrema de compreender a infinita complexidade dos factos.
Num dos mais admiráveis episódios, McAvoy é alvo da violência pornográfica da imprensa cor de rosa. Sem simplificar a sua personagem (bem pelo contrário, ele é um poço de contradições e está longe de ser um “menino de coro”), The Newsroom coloca em cena uma das grandes questões da informação contemporânea: a impossibilidade de conciliar a exploração vergonhosa da vida dos outros com as leis mais básicas do jornalismo.