Blur
“Parklife”
Food / EMI Music
5 / 5
E, de repente, eram famosos... Algo que não morava, pelo menos no patamar que atingiram, nos seus horizontes, uns tendo lidado melhor que outros com o novo estatuto. Mas estas foram as consequências. A causa resultou da forma como um álbum foi o disco certo no lugar certo na altura certa...
Tudo começara, na verdade, com a focagem de interesses e caminhos que haviam feito em 1993 em Modern Life Is Rubbish, onde descobriam no universo ao seu redor (ou seja, o Reino Unido e os espaços da classe média) a matéria prima para uma forma de olhar e comentar. Aplaudido, o disco não foi contudo um sucesso (ficando mesmo aquém dos resultados de Leisure), pelo que as finanças dos Blur não eram coisa que se invejasse naqueles dias. E estavam ainda na estrada quando começaram a compor novas canções, gravando maquetes aos poucos, à medida que o tempo e o orçamento disponíveis iam permitindo. De heranças britânicas ia vivendo o que, aos poucos, iam compondo e pensando, entre ecos de memórias da pop dos anos 60, do psicadelismo, do punk e mesmo da new wave surgindo pistas que, sem uma agenda de arrumação antológica, não deixava de transportar para o álbum em construção uma coleção de heranças fulcrais de episódios maiores da história da canção popular inglesa. Em fevereiro de 1994 o aperitivo surpreendia tudo e todos. Revelava um novo rosto, e resultava num êxito sem precedentes na carreira da banda, levando-os ao top 5 no Reino Unido. Sob atmosfera disco e com alma pop, Girls and Boys era aquilo a que, no booklet da presente reedição, Graham Coxon recorda como um momento em que entre a banda havia quem julgasse que estava nos Wire, nos Duran Duran, ou a escrever observações sobre o mundo à sua volta... O single definiu necessariamente um rumo, nem para o álbum nem para o futuro dos Blur, mas revelava por um lado uma nova forma de herdar e assimilar influências, experiências e formas de comentar. Ao mesmo tempo constatando o sucesso obtido que o mainstream tinha entretanto rumado ao encontro da mesma ideia. O entusiasmo ‘brit’ pela sua pop ganhava fôlego. E o álbum Parklife, que nasceria em abril de 1994, era aclamado como o rosto central de uma nova cool britannia. O brit pop era oficialmente aclamado não só pela imprensa musical, mas pelos media generalistas e via nos Blur um dos seus rostos centrais. Hoje é mesmo impossível revisitar o disco sem recordar o contexto que o viu nascer e transformar em retrato de uma época. Eram tempos de prosperidade e entusiasmo, esse sentido otimista cruzando um alinhamento onde tanto coexistem os momentos de entusiasmo entre copos (como no tema-título, onde colabora Phil Daniels e quase imaginamos um pub em festa), primeiras reflexões sobre o envelhecimento (em End of a Century) ou expressões de considerações mais pessoais (como em To The End, onde se levantam sinais de um registo que Damon Albarn aprofundaria em episódios seguintes) e uma expressão de inesperada grandiosidade sinfónica no magnífico This Is a Low (que, nunca tendo sido single, é um dos “clássicos” deste alinhamento. Herdeiros de Ray Davies, de David Bowie, de Syd Barrett, de Paul Weller, os Blur escreviam em Parklife o seu grito do Ipiranga. De herdeiros começavam a caminhar para se transformar, com o tempo, nume herança. E passados todos estes anos, é coisa que parece ter atingido aquele raro patamar do reconhecimento unânime.
Na presente reedição entre os extras do segundo disco encontramos sobretudo os lados B dos quatro singles extraídos, entre os quais se destacam uma ainda mais luminosa remistura dos Pet Shop Boys para Girls and Boys ou uma leitura em francês para To The End. Há ainda ecos de uma sessão acústica para a BBC e uma leitura igualmente acústica de End of a Century editada num promo espanhol.