Com O Cavaleiro das Trevas Renasce, Christopher Nolan coloca um ponto final na sua convivência com o "homem-morcego": desde o Batman, de 1989, esta é uma história de sete filmes, três realizadores e quatro actores — este texto foi publicado no Diário de Notícias (1 Agosto), com o título 'Christopher Nolan encerra a sua trilogia de Batman'.
Perante o fausto espectacular e a sofisticação técnica do novo filme de Batman, O Cavaleiro das Trevas Renasce (estreia: 2 Agosto), talvez não possamos deixar de pensar nas muitas transfigurações cinematográficas a que tem sido sujeito o “homem-morcego” de Gotham. De facto, estamos bem longe do universo “kitsch” de Batman: The Movie (1966), primeira adaptação para cinema da banda desenhada criada, em 1939, por Bob Kane. Nessa altura, Batman era apenas uma pequena produção derivada de uma série televisiva, aliás repetindo os mesmos protagonistas, Adam West (Batman) e Burt Ward (Robin), e utilizando um realizador, Leslie H. Martinson, que assinara alguns dos seus episódios.
Agora, Batman é muito mais do que uma curiosidade mais ou menos pitoresca. Em boa verdade, tornou-se um dos grandes negócios da indústria de Hollywood e, por certo, um dos casos de maior sucesso na relação entre os “blockbusters” e o universo das histórias aos quadradinhos. Para a DC Comics, editora de Batman, o cinema foi mesmo decisivo para o relançamento de uma personagem que, ao longo dos anos 70, dava sinais de esgotamento criativo e comercial.
A viragem aconteceu em 1989, com o filme que se intitulava apenas Batman, dirigido por Tim Burton e interpretado por Michael Keaton. Seguiu-se mais uma realização de Burton, Batman Regressa (1992), ainda com Keaton, surgindo depois dois títulos assinados por Joel Schumacher: Batman para Sempre (1995) e Batman & Robin (1997), protagonizados por Val Kilmer e George Clooney, respectivamente. Christopher Nolan é o responsável pela trilogia que inclui Batman – O Início (2005) e O Cavaleiro das Trevas (2008), agora concluída com O Cavaleiro das Trevas Renasce, sempre com Christian Bale no papel do herói. Contas redondas, todos estes filmes representam mais de 3.200 milhões de dólares (cerca de 2.600 milhões de euros) de receitas nas salas de todo o mundo, isto sem contar com as muitas, e muito lucrativas, derivações em jogos de vídeo e merchandising.
Em todo o caso, Nolan é normalmente apontado como aquele que salvou a vida cinematográfica de Batman, começando por recusar a abordagem mais ligeira, tendencialmente burlesca, proposta pelos filmes dirigidos por Schumacher. Nesta perspectiva, o seu Bruce Wayne, milionário que se transfigura em “cavaleiro das trevas” para combater os criminosos de Gotham, participa do negrume (gráfico e moral) do “novo” Batman, recriado pelas histórias escritas e desenhadas por Frank Miller, publicadas em 1986 sob a designação Batman: The Dark Knight.
O Cavaleiro das Trevas Renasce, já assumido por Nolan como o seu derradeiro filme sobre o vingador mascarado, apresenta como principais novidades a figura ameaçadora, paradoxalmente frágil, de Bane (Tom Hardy) e esse símbolo de uma sensualidade malévola que é a “Cat Woman” (Anne Hathaway), desta vez identificada apenas pelo nome de Selina Kyle. Além do mais, sem abdicar da exuberância do espectáculo, Nolan conseguiu cumprir o seu voto: a sua trilogia de Batman encerra sem ter recorrido às imagens a três dimensões.