terça-feira, julho 03, 2012

Um 'reality show' em Marte?



Um reality show transmitido em direto de Marte? Parece coisa de ficção científica pouco imaginativa... De resto a série Virtuality, coisa sci-fi que envolvia uma nave a andar pelo sistema solar, transmitindo um reality show para a Terra nem passou do episódio piloto que a Fox transmitiu há poucos anos... Quem quererá saber como estão a correr as obras de calibragem de uma central de tratamento do habitat C, quantas partes por milhão de um metal raro foram encontradas numa amostra de solo, no drama da porta de acesso à garagem dos veículos que está a abrir menos bem ou da discussão acesa entre dois astronautas, em pleno passeio na superfície, sobre uma característica do relevo. “Foi erosão por água”, diz um. “Onde? Estás doido? É claro que foi derrocada gravítica”, responde o outro. E na terra, com um pacote de bolachas na mão, uma família olha deliciada para a mais recente ligação em direto para Marte... Afinal, em quem votarão esta semana?


Uma missão a Marte... Por aí, é verdade, a ideia está longe de ser um sonho novo... Mas numa era em que as palavras “contenção” e “cortes” são das mais usadas por quem decide orçamentos, uma eventual missão tripulada ao planeta vermelho parecia coisa adiada para as calendas... marcianas. E eis que entra em cena o projeto Mars One. É coisa privada, à procura de apoios e donativos... Visa a criação gradual de uma primeira colónia permanente, desde logo com um primeiro senão: as viagens são de ida (quem for, por lá fica)... A opção explica-se pela substancial redução de custos que representa uma agenda de vôos sem a necessidade de projetar um regresso. A maior das surpresas deste projeto (e isto se a coisa for mesmo real e não uma partida bem pregada) é contudo a vontade de associar à missão um reality show, os direitos de transmissão deste “big brother” marciano sendo pensados como uma das principais fontes de financiamento e mediatização. Se a ideia parece disparate desinteressante, a verdade é que a progressiva hipnose dos públicos frente a formatos do género parece justificar que haja quem pense que o modelo possa resultar. Quer isto dizer que quem pensa o que será a televisão do nosso futuro próximo acha que informação televisiva se demitirá de ser a chave do acompanhamento de uma missão desta envergadura? Afinal somos uma sociedade que acredita mais no show da realidade que na realidade de facto? O “disparate” marciano, pelos vistos, deve fazer-nos pensar sobre algo que está mais perto. Quem somos hoje? E até onde deixaremos que este modelo de televisão possa moldar a nossa forma de olhar o mundo? E, já agora, os outros mundos à nossa volta?...

PS1. Se um dos ganchos para "agarrar" espectadores e estimular a sua interatividade num reality show são as votações para "expulsão" como se resolve a coisa num programa sem viagem de regresso à Terra? Seguem recambiados para uma das Luas de Júpiter?

Podem ver aqui o filme promocional que apresenta o projeto Mars One.

E aqui o acesso ao site oficial do projeto.

PS2. Resta saber se tudo o que encontramos no site do projeto é de facto realidade ou uma ficção (como o foi o alerta viral para o dia em que Marte se aproximaria da Terra a ponto tão visível quanto a Lua). De resto, entre os artigos já publicados sobre este projeto há quem questione a sua exequibilidade técnica e humana. E levante esta dúvida: será mesmo verdade?

Podem ler aqui um artigo publicado pelo International Business Times que coloca estas questões.