domingo, abril 08, 2012

A Bósnia filmada por Angelina Jolie (2/2)

Zana Marjanovic e Angelina Jolie
(rodagem de Na Terra de Sangue e Mel)

Com a sua primeira realização, Na Terra de Sangue e Mel, Angelina Jolie arrisca, de forma brilhante, lidar com as memórias traumáticas da guerra da Bósnia — este texto foi publicado no Diário de Notícias (5 Abril), com o título 'Uma história de amor e sangue'.

1 ] Com Na Terra de Sangue e Mel, Angelina Jolie fez um filme vibrante, de notável rigor de mise en scène, sobre a guerra da Bósnia. O certo é que há todo um aparato mediático que continua a considerar que fazer jornalismo sobre o seu trabalho é especular sobre o facto de o vestido que ela usou na cerimónia dos Oscars (lindíssimo, por sinal) expor a sua perna direita... Consciente da avalancha de estupidez que assim se promove, Jolie decidiu arrumar o assunto de vez, numa resposta a uma pergunta da revista Time (com data de 9 de Abril), aplicando um adequado sarcasmo: “De facto, esse era o vestido de reserva. Decidi escolher aquele que chamava menos a atenção.”
Dito de outro modo: mesmo que se possa ter uma reacção reticente ou menos entusiasta face a Na Terra de Sangue e Mel, aquilo que está em jogo é demasiado sério e grave para assistirmos passivamente ao triunfo de uma visão das estrelas de cinema que as reduz (e reduz os próprios espectadores) a patetas alegres, sem ideias nem sensibilidade. Mais do que isso: este é um filme que convoca questões muito particulares, e também muito perturbantes, relacionadas com a coesão do continente europeu, relembrando um conflito que deixou uma interrogação amarga e desesperada: afinal, o que é isso de ter uma identidade nacional?
Acima de tudo, Angelina Jolie vem reafirmar as potencialidades de um realismo estrito que não menospreza, bem pelo contrário, os recursos de uma elaborada escrita melodramática. Na Terra de Sangue e Mel não é uma história de amor cujo “pano de fundo” seria a guerra, mas sim uma história em que o amor, na sua infinita vulnerabilidade, também faz parte da guerra. Saber mostrar (e pensar) tudo isso está longe de ser sorte de principiante.