Se há vítimas da temporada dos Oscars, então, este ano, Young Adult/Jovem Adulta, de Jason Reitman, com uma fabulosa composição de Charlize Theron, é por certo a mais notória — este texto foi publicado no Diário de Notícias (3 Fevereiro), com o título 'Os restos do Sonho Americano'.
Os filmes são também o contexto em que são vistos (ou ignorados). Daí o distanciamento que sinto face ao delírio em torno de O Artista e das suas hipóteses de ganhar muitos Oscars... Porque o considero um filme apenas simpático, em nada representativo do melhor cinema contemporâneo? Sim, não o vou esconder. Mas mesmo que fosse uma obra-prima universal, a questão mantinha-se: a relação de muitos sectores do público e do jornalismo com o cinema está marcada por ondas (marketing, modas, etc.) que criam “fenómenos” que impedem de fruir a pluralidade da própria criação.
Jovem Adulta, de Jason Reitman, será uma das vítimas actuais desses mecanismos de celebração e desgaste: um filme de fulgurante inteligência, revisitando uma América profunda que, com paciência e delicadeza, o argumento de Diablo Cody representa num misto contagiante de tristeza e serenidade. Cody já tinha escrito para Reitman o excelente Juno (2007), sobre uma adolescente a viver uma inesperada gravidez. Era uma aventura de muitos e contraditórios afectos atravessada por um acutilante subtexto feminino (não feminista). Encontramos algo semelhante em Jovem Adulta, seguindo uma mulher (Charlize Theron, genial) que, por uma espécie de impulso visionário, acredita na possibilidade de regressar à sua cidade esquecida, retomando no mesmo ponto as histórias vividas nos tempos do liceu...
Reitman começa nos terrenos aparentemente ligeiros da comédia romântica para, a pouco e pouco, expor um negrume sem ilusões: este é um objecto de bizarro desencanto, empenhado em observar os restos do Sonho Americano. Em boa verdade, trata-se de enfrentar a difícil arte de envelhecer. Ou como diz o cartaz original do filme: “Todos envelhecem. Nem todos crescem.”