quinta-feira, novembro 03, 2011

Saber olhar (e saber narrar)


Um dos mais belos filmes que vimos este ano chega agora a DVD. Trata-se de Mel (Bal no original), terceira parte de uma trilogia assinada pelo turco Semih Kaplanoglu e que venceu o Urso de Ouro em Berlim. É uma história feita de poucas palavras. O seu protagonista, de seis anos, só fala mesmo com o seu pai, um apicultor que anda pelas florestas atrás de colmeias. É o único junto ao qual fala, sussurrando-lhe palavras ao ouvido. O seu desaparecimento é assim sentido como uma perda maior, a da presença, da companhia e mesmo da comunicação...

Com uma soberba fotografia, um olhar que sabe entender o ritmo do lugar onde a narrativa acontece e uma vontade em nos mostrar os espaços (sem que haja um programa Canal Viagens, ou qualquer coisa do género pelo caminho), Mel é um filme que junta uma história a um espaço revelando qual é, afinal, a essência mais profunda de um cinema que acredita que ser contemplativo e “de autor” não significa o abdicar de uma vontade de contar histórias. Escrevi aqui, em Março deste ano, por alturas da estreia do filme nos nossos ecrãs, que “Mel é mais um filme de sensações que de grandes arcos narrativos. De pensamentos não necessariamente verbalizados. De afectos... Há um contexto. O da vida familiar de um apicultor, dias passados entre a floresta, subindo a altas árvores e o espaço tranquilo de uma casa que vemos, sempre, pelo olhar do filho. Há um texto, que acompanha, sem a necessidade de um “era uma vez”, um tempo em a ausência do pai ensurdece mais ainda o mundo calado do pequeno Yusuf. E há, no fim, uma das melhores experiências de cinema que temos visto chegar aos ecrãs nos últimos anos”. Pena apenas que entre nós tenha sido apenas editado este terceiro “episódio” de uma trilogia que se estreou em 2007 com Yumurta (Ovo) e teve continuação em 2008 em Süt (Leite).