Convenhamos que Kate Winslet e o fotógrafo Mario Testino não escolheram o mais simples dos desafios: para a edição de Setembro da revista V, propõem um portfolio em que a actriz se confronta com algumas imagens emblemáticas de Elizabeth Taylor, incluindo uma especialmente célebre em que ela surge com um colar de pérolas a desenhar uma moldura para o olhar (e que serve de padrão à fotografia escolhida para a capa da revista).
Acompanhado por uma entrevista assinada por Michael Martin, o dossier fotográfico parte da actualidade da própria actriz, com dois filmes marcantes, Contagion e Carnage (respectivamente de Steven Soderbergh e Roman Polanski) e ainda a série da HBO, Mildred Pierce (dirigida por Todd Haynes). O trabalho editorial aposta na possibilidade de recuperar uma sobriedade muito clássica em que se joga mais do que a "imitação" das poses, também elas clássicas, de Taylor. Trata-se, afinal, de afirmar uma linhagem em que a pertença ao cinema não pode ser dissociada de uma vocação iconográfica que sugere o poder divino do ícone. Este é mesmo um caso limite, de uma só vez venerador e perverso, em que uma actriz se reafirma ocupando o lugar de outra. Mais do que isso: é um exemplo modelar do modo como o glamour funciona como uma herança que importa manipular com especial delicadeza. Delicadeza que se confunde com uma forma de amor: afinal, aquilo que Winslet diz não é apenas "eu não sou Elizabeth Taylor"; é também "vocês sabem quem eu sou".