Entre os muitos artigos escritos em torno dos dez anos do 11 de Setembro, After 9/11 - The limits of remembrance, de David Rieff, publicado na edição de Agosto da revista Harper's, é por certo um dos mais contundentes e perturbantes. Qualquer resumo, condensação ou comentário corre o risco de minimizar as suas nuances, pelo que se recomenda vivamente a sua leitura.
Simplificando, digamos, então, que Rieff postula a possibilidade de a palavra de ordem moral – nunca esquecer – não excluir uma prática metódica, por assim dizer profilática, de paralelo abandono da matéria das memórias. É ele o primeiro a reconhecer que semelhante hipótese argumentativa e existencial não colhe apoios junto da "direita nacionalista", nem nas hostes da "esquerda orientada pela defesa dos direitos humanos". Aliás, não deixa de sublinhar também que não vê nas cerimónias do décimo aniversário qualquer carácter maligno. O problema que coloca é de outra natureza. Ou seja: o de não ser possível viver apenas na continuada reiteração da memória, como se ela fosse a garantia principal de uma bênção, individual e colectiva, que por cândida magia nos vai colocando do lado do bem definitivo (a expressão é minha).
Recordando a sua experiência de repórter na guerra da Bósnia, "um conflito em larga medida alimentado pela memória (ou, mais exactamente, pela incapacidade de esquecer)", Rieff fala da lição que aprendeu, isto é, do "medo" que lhe desperta a "memória histórica colectiva". E acrescenta: "A memória pode fazer com que a história pareça apenas um arsenal recheado de armas para manter as guerras e enfraquecer a paz." Daí que o seu texto desemboque numa interrogação sobre a possibilidade de converter as energias gastas a lembrar. Como? Trabalhando para um modo de viver em que "a opção do esquecimento seja vista, pelo menos, como tão disponível como o dever de lembrar."