Iniciamos hoje a publicação da versão integral de uma entrevista com James Blake
que serviu de base ao artigo “Um músico solitário frente a multidões”
que foi publicado na edição de 16 de Julho do DN Gente.
Como é que uma música tão privada se comporta frente a tanta gente nos concertos que tem dado em festivais. É uma música muito pessoal... Falar é violento?
Tornamo-nos menos tímidos à medida que o tempo avança e vamos trabalhando. Tenho actuado muito como DJ e dado também bastantes concertos. E temos de falar com tanta gente a todo o momento que não podemos no fundo ser mais assim... Mas na verdade sempre falei com as pessoas, nunca fui introvertido. Sempre pensei muito... Sou filho único e sempre tive muito tempo para estar sozinho entre os meus pensamentos. Mas nunca fui introvertido.
Não lhe parece contraditória esta ideia de ver uma música que nasceu num espaço solitário frente a tamanha multidão?
É uma contradição, sim... Até mesmo um paradoxo, mas interessante. Mas tem sido um processo muito positivo e não me arrependo nunca de tocar frente a muitas pessoas. Tem sido uma experiência interessante, mesmo. Há artistas que não o conseguem fazer, é certo. Artistas cuja música é tão pessoal, que sentem que aquele não é o seu lugar. Antes de começar a tocar em festivais comecei por pensar como é que tudo isto seria... E o que aconteceria com a minha música. Mas depois do primeiro concerto, que teve lugar no Primavera Sound, em Barcelona, senti que o podia fazer. Se toda esta gente veio para me ver então é porque tenho algo em comum com eles. Há uma ligação que já estava ali mesmo antes de eu começar a tocar e isso deixa-me confortável.
Esta passagem pelos palcos e estas vivências de multidão inspiram o que possa vir a ser o futuro próximo da sua música ou anseia, antes, por um regresso ao quarto e ao trabalho mais solitário?
Talvez, mas não sei... E não sei sobretudo porque na verdade quase não tive tempo de folga nos últimos seis meses. Trabalho todos os dias. Mas ao mesmo tempo tenho escrito alguma música nestes últimos meses... E tudo vem de um sítio que é muito agitado na minha mente. Não estou num lugar sereno neste momento. Estou num lugar que me obriga a levantar cedo na manhã seguinte opara ir de avião para outro sitio... E esse não foi o ambiente em que escrevi o primeiro álbum, daí que o segundo possa ser diferente. De certa maneira gosto de escrever música para saír de tudo isto. Mas no fim sinto que soa muito a mim. E estou muito orgulhoso com o que fiz nestes últimos meses. Sinto que é uma progressão e, senão mesmo, melhor que o que fiz antes. Mas não vai ser um álbum. Não vou editar um álbum no futuro mais próximo. Sinto que o que tenho escrito recentemente é um passo em frente. Tocar ao vivo tem ajudado. A minha voz está mais forte. Sinto que a controlo melhor e que estou mais à vontade.
(continua amanhã)