Para comemorar os 25 anos da estreia de Top Gun, os cinemas AMC promoveram, nos EUA, uma breve reposição do filme de Tony Scott, decisivo na ascensão popular de Tom Cruise — este texto foi publicado no Diário de Notícias (30 de Abril), com o título 'Quando ainda havia estrelas'.
A visão corrente do cinema popular, sobretudo o de origem americana, está dominada pela celebração beata dos milhões (de dólares). Assim, exaltam-se os 954 milhões acumulados pelo mais recente “Harry Potter”, quase sempre omitindo que custou 250, cerca de um quarto desse valor. Ora, há 25 anos, Top Gun acumulava 353 milhões nas salas de todo o mundo, tendo custado 15. Dito de outro modo: a receita bruta multiplica por mais de vinte os seus custos.
Claro que os filmes não se avaliam pelo dinheiro que rendem e o simpático Top Gun, convenhamos, não é propriamente uma data decisiva na evolução das formas cinematográficas. Mas os números ajudam-nos a perceber que falamos de uma época em que a mobilização de espectadores se fundamentava ainda nos actores e nas suas qualidades simbólicas: afinal de contas, foi este filme que transformou Tom Cruise numa estrela.
Daí o paradoxo da reposição de Top Gun nas salas americanas: por um lado, celebra-se um tempo ainda clássico do consumo dos filmes; por outro lado, a sua solidão comercial contrasta com a mobilização das audiências através da promoção pueril dos “efeitos especiais” e da agressividade de campanhas cada vez mais formatadas.
Não por acaso, em muitos discursos jornalísticos, passou a ser chique difamar o trabalho de Tom Cruise. Tendo em conta que, depois de Top Gun, ele protagonizou filmes como A Cor do Dinheiro (Martin Scorsese, 1986), De Olhos Bem Fechados (Stanley Kubrick, 1999) ou Relatório Minoritário (Steven Spielberg, 2002), podemos compreender como vai mal a percepção mediática do mundo do cinema: celebram-se os milhões e menosprezam-se os actores. Entretanto, haverá sempre alguém para proclamar que a culpa é dos críticos...