É bom (é mesmo muito bom) encontrar filmes que transportam um enigma que nos desafia — e tanto mais quanto os filmes não existem exactamente para "normalizar" esse enigma. Sleeping Beauty, título de estreia da escritora australiana Julia Leigh, é um filme assim: uma história assombrada e gélida de uma estudante universitária que vende serviços "sexuais" em que é colocada a dormir para, segundo determinadas "regras", ser utilizada por homens idosos. Há, aqui, um realismo desencantado das relações humanas que se vai desdobrando numa cruel fábula existencial, visceralmente contemporânea. Faz lembrar alguns dos primeiros títulos da filmografia de Chantal Akerman (p. ex.: Je, Tu, Il, Elle, de 1974), mas é um trabalho pessoalíssimo, afirmando uma verdadeira autora.