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| THE BIG FIX |
1. No mundo das notícias, ja não há muitas notícias... Predomina o fogo posto. A ideia é provocar as labaredas mais altas para, depois, as ir apagando com espírito comunitário de "bombeiro" (e os bombeiros não têm culpa deste simbolismo que a eles se cola).
2. Veja-se o alarido em torno das palavras de Lars von Trier, em Cannes, na conferência de imprensa do seu filme Melancholia, declarando que "compreende Hitler". Pura estupidez, como é obvio, depois corrigida por uma declaração formal de desculpas. Seria dupla estupidez escamotear a gravidade da "brincadeira" do cineasta dinamarquês. Em todo o caso, que delírio simplista promovê-la a evento mediático de um festival carregado de coisas interessantes! E, já agora, porque é que todas as notícias sobre a conferência de imprensa sublinhavam o choque das actrizes (Kirsten Dunst e Charlotte Gainsbourg), numa estranha discriminação feminina que parecia reduzir os homens sentados ao seu lado (e eram vários, entre actores e elementos da equipa do filme) a marionetas não imputáveis?
3. No mesmo dia, em Cannes, Peter Fonda fez questão de mostrar que a irresponsabilidade pueril de Lars von Trier não é seu exclusivo. A propósito da passagem do documentário The Big Fix, sobre o desastre da plataforma petrolífera da BP no Golfo do México, o actor americano (coprodutor do filme) achou por bem responsabilizar o Presidente Barack Obama nesse processo dramático, chamando-lhe "traidor filho da puta" (fucking traitor).
4. Porque é que o insulto de Fonda não adquire eco de "escândalo", a par das declarações de Lars von Trier? Difícil lidar com estes contrastes, desde logo porque, escusado será dizê-lo, é perfeitamente legítimo que Peter Fonda, ou quem quer que seja, exprima o seu descontentamento em relação às políticas de Obama. Mas não é isso que, aqui, se refere. Acontece que ficamos a saber que uma "diversão" grosseira em torno da memória historica, proferida por um cineasta que não pensa aquilo que diz, merece ser transformada em acontecimento global... Ao mesmo tempo, parece natural que a expressão "presidente-filho-da-puta", inserida no discurso de um actor militante das causas da Natureza, baste para lidar com a infinita complexidade de uma catástrofe ecológica, o seu enquadramento económico e também o seu significado civilizacional.
5. Só posso exprimir-me na primeira pessoa: senti-me provocado por Lars von Trier e desiludido com Peter Fonda — escusado será dizer que, em qualquer caso, não espero nem desejo que as notícias reflictam os meus estados de alma.