sexta-feira, abril 01, 2011
Da Europa à América
É apenas no contexto de quem vive sob as profundas raízes e tradições de uma cultura ocidental (que entretanto ganhou expressão global) que se compreende a questão que se levanta indagando quando surgiu uma música americana... Isto porque remotas certamente serão as expressões de uma identidade autóctone entre as tribos que povoaram cedo as terras daquele a que os europeus chamariam mais tarde o "novo mundo". As primeiras gerações de povoadores europeus levariam então às Américas ecos de outras escolas musicais que acabariam por dominar os acontecimentos entre as novas comunidades durante os primeiros tempos de novas vidas nesse novo mundo... Mas o tempo acabou por vincar, também na música, a distância que um oceano separa, as novas paisagens e vivências, a comunhão de experiências entre os povos que ali se juntavam... Apontam-se então nomes como os de Charles Ives, Gerorge Gershwin, Aaron Copland, Samuel Barner, mais tarde Leonard Bernstein, como autores de importantes contributos para a definição de uma nova ideia de música americana pela qual caminham heranças de tradições europeias, a nova geografia expressando-se contudo de forma mais visível... Mas entre os primeiros ensaístas de uma noção de música americana, ou pelo menos marcada por uma experiência americana, conta-se a presença de um checo, por uma temporada, naqueles lados do Atlântico. Em período de trabalho nos EUA, e tendo entre mãos a composição de uma sinfonia que celebrasse a memória da chegada de Colombo, Dvorák escutou o mundo ao seu redor e projectou-o na partitura... Foi dos primeiros a compreender o enorme potencial da música afro-americana enquanto força maior necessária para a criação de uma “grande e nobre escola nacional”.
Tinha razão. Razão que não apenas o jazz, o rock’n’roll, a soul ou o hip hop reconhecem, a obra de compositores vários, de um Gershwin ou Bernstein a Steve Reich compreendendo tão bem esse importante espaço cultural que assim ganhou natural peso enquanto importante carga genética. Estreada em 1904, a Sinfonia Nº 9 de Dvorák, também conhecida como Do Novo Mundo, incorpora essas reflexões na construção de uma visão da América, com o ponto de vista de um visitante. O fulgor da descoberta, a força indomável da natureza, a grandiosidade dos espaços, passa por esta música, a pulsante direcção de Lawrence Foster frente a uma notável Orquestra Gulbenkian tendo-nos permitido caminhar, mesmo sem sairmos dos nossos lugares.
Foi uma noite brilhante em todos os sentidos, na primeira parte (que antecedeu, portanto, o Dvorák) tendo o pianista Arcadi Volodos (na imagem) partilhado com a Orquestra Gulbenkian uma vibrante leitura do Concerto para Piano e Orquestra Nº 2 de Johannes Brahms.