Um conto, com sabor a maresia, de Robert L Stevenson. Este texto foi originalmente publicado na edição de 26 de Fevereiro do DN Gente.
Não construiu faróis como mandava a tradição da família. Mas o mar não está longe de muitas das histórias de Robert Louis Stevenson (1850-1894). Uma das narrativas, com mar por perto, do mesmo autor de A Ilha do Tesouro, é o conto Os Folgazões (de 1882) e disponível entre nós em tradução de Aníbal Fernandes, pela Assírio & Alvim. O mar é aqui, mais que um cenário, o motor que desencadeia uma história que fala, sobretudo, do fulgor das ondas, da força indomável das águas e dos naufrágios que se contam junto a um promontório que acolhe o protagonista. Charles chega àquele ponto da costa escocesa no pico do Verão com dois objectivos na sua agenda: encontrar o tesouro da Invencível Armada espanhola, que crê ter sido afundada não muito longe da casa à beira-mar do seu tio, e casar-se depois com Mary Ellen, a sua prima. O mar cativa-o. As suas ondas cruéis escondem segredos. Descobre depois destroços, vestígios. Lança suposições. Conhece figuras inesperadas. Mas, aos poucos, a razão esvai-se e a obsessão domina-o, a vertigem do oceano (as grandes ondas, ou seja, "os folgazões") acabando por chamá-lo, sem recusa... Como explica o tradutor numa esclarecedora nota de contextualização que abre o livro, "Os Folgazões é o primeiro" dos textos de Stevenson "com uma autenticidade escocesa caucionada pelo dialecto gaélico". Das suas palavras nascem ainda sensações de desconforto, medo e maresia, o som e força das ondas, na verdade, morando entre as páginas deste conto.