sexta-feira, janeiro 21, 2011
Mais que apenas maestro e professor...
Como maestro assinalou estreias de obras históricas. Como professor teve alunos notáveis (entre os quais Schönberg, Webern, Berg ou Korngold). Mas no trabalho como compositor viveu numa quase terra de ninguém, não suficientemente aventureiro segundo os que procuravam novos caminhos na Europa da primeira metade do século XX (nunca chegaria a adoptar o atonalismo), mas visto como demasiado modernista pelos mais conservadores de então... Austríaco de origem judaica, emigrado para os EUA nos anos 30 (onde se radicou), Alexander von Zemlinsky (1871-1942) foi durante muito tempo um nome relativamente esquecido no traçar do panorama musical do seu tempo. Redescoberto mais recentemente, começa a ver a sua música a chegar com mais regularidade aos discos e programas de concertos.
Dirigida por Simone Young, a Orquestra Gulbenkian apresentou esta semana a sua Sinfonia Lírica. Estreada em Praga em 1924 é, um tanto como A Canção da Terra de Mahler (que o próprio Zemlinsky citou como comparação numa altura em que trabalhava nesta obra), um ciclo de canções com orquestração. Porém, e fruto talvez da relação que o compositor desenvolveu com a ópera (compôs sete), a Sinfonia Lírica reflecte uma coesão firme entre as partes, conduzindo a música, através do avançar das palavras cantadas, uma aparente puslão narrativa. Com as presenças de Miriam Gordon-Stewart (soprano) e Bo Skovhus (barítono), a obra de Zemlinsky projectou pelo Grande Auditório um desafio de (re)descoberta.
O melhor da noite chegou contudo na primeira parte do programa com uma magnífica passagem pela música de Debussy, um dos inventores de um novo som na aurora do século XX. De 1901, Nocturnes é uma visão, em três andamentos, feita de subtis acontecimentos que a orquestração vai desenhando. Um estudo sobre o cinzento, como o compositor chegou a referir, Nocturnes é uma das obras de Debussy onde se reconhecem espaços de possível relacionamento do compositor com os mundos das artes plásticas e da poesia seus contemporâneos. A interpretação dirigida por Simone Young foi notável, o coro igualmente irrepreensível na sua entrada, no andamento final da obra. Antes, a abrir o programa, a curta Pavane, de Fauré, numa leitura que fez sobressair as qualidades delicadas desta composição estreada em Paris em 1888.