sábado, novembro 06, 2010

O reencontro (onze anos depois)


É como a terceira parte de uma ideia que, ninguém sabe ainda, poderá ter ainda continuação. Em 1994 o saxofonista Jan Garbarek juntou-se ao grupo vocal Hilliard Ensemble em Officium, um disco que juntava ecos da música medieval e renascentista a liberdades jazzísticas características da música do norueguês. Cinco anos depois Mnemosyne deu continuidade a uma das mais bem sucedidas colaborações na história do catálogo da ECM. E agora, onze anos depois desse segundo episódio, Officium Novum retoma uma relação, moldando-a a uma nova visão.

Há um destino geográfico, mais que um tempo, no horizonte que define este reencontro entre Jan Garbarek e o Hilliard Ensemble. A Arménia. E, sem o rigor de uma fronteira política, o espaço (cultural, entenda-se) que define, juntamente com os que a envolvem. Há também aqui um nome em foco. Trata-se de Komitas Vardapet (1869-1935), sacerdote e musicólogo que tomou em mãos o desafio de fazer uma recolha da música litúrgica arménia, encontrando as suas raizes genéticas em tradições folk locais. Como explica Thomas Steinfeld no booklet que acompanha esta edição, Komitas mostrou também um interesse em ligar depois a música ocidental moderna a “uma das mais antigas tradições da cristandade”, sublinhando que “certamente não terá evitado o enfatizar do potencial expressivo e modernista que estava contido nestas canções”… Algumas composições de Komitas, que datam de um período entre 1910 e 1915 são peças centrais no alinhamento deste álbum que, não representando naturalmente música para um serviço religioso, sugere a ideia de uma liturgia. A Komitas juntam-se assim outros autores de outros tempos, de Litany de Kedrov (um discípulo de Rimsky-Korsakov) a Most Holy Mother Of God, de Arvo Pärt ou mesmo composições do próprio Jan Garbarek. Há aqui um sentido de liberdade expresso sobre uma série de peças que, todavia, não evitam nunca um sentido de rigor que parte da forma como a recolha e junção de peças se define e, claro, passa depois pela sua interpretação. Os tempos diuem-se. E a geografia, embora sugerida, liberta-se através do diálogo que se esboça entre o canto e o saxofone.